São Paulo, sexta, 25 de dezembro de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Missão de Duisenberg é controlar a inflação

do enviado especial a Viena

Ao ser designado, em maio, presidente do Banco Central Europeu, Willem F. Duisenberg ganhou direito integral não aos 15 minutos de fama que cabem a qualquer mortal, mas a quatro anos.
É o que durará o mandato desse holandês de 63 anos, que já comandou o Banco Central holandês, foi ministro das Finanças em seu país e deputado (pelo Partido Socialista, o que parece ideologia incompatível com o novo cargo).
Justa ou injustamente, socialistas são acusados de gostar de gastar dinheiro público. Como presidente do BCE, Duisenberg tem, ao contrário, a missão de manter a inflação absolutamente sob controle.
O próprio Duisenberg, mais conhecido como Wim do que como Willem, confessou ao jornal britânico "Financial Times": "Ainda tenho de me acostumar à intensidade com que o mundo acompanha cada palavra que eu diga ou cada movimento que faça".
É bom que se acostume logo: o mundo está obrigado a seguir palavras e atos de Duisenberg muito de perto, na medida em que é o principal responsável por definir o custo do dinheiro em uma nova moeda, o euro, que tende a ser o primeiro desafio à hegemonia do dólar nos últimos 60 anos, assim como hoje segue as palavras e atos de Alan Greenspan, presidente do Fed (Banco Central dos EUA).
Esse convívio com a fama começou bem se, como qualquer ser humano, Duisenberg preferir elogios às críticas: no último dia 3, dez países que aderiram ao euro reduziram para 3% ao ano os seus juros, patamar que será adotado pela Itália no próximo dia 28. Os mortais comuns e o empresariado adoram juros baixos, como é óbvio, porque tornam o capital mais acessível.
Mas pode ter sido a última vez, por um bom tempo, que os aplausos, ao menos por essa razão, serão ouvidos por Duisenberg: ele já antecipou que a taxa de juros deverá permanecer como está "pelo futuro previsível". Ele mesmo admite que sua tarefa não será nada fácil, pois ele e o BCE vão navegar "por águas nunca antes navegadas".
De fato, é uma experiência única um banco central poder fixar os juros, mas não ter influência sobre o orçamento de cada membro da "euroland" ou sobre a taxa de câmbio (a ser definida, no dia 31, pela Comissão Européia).
Por isso mesmo, baixar os juros poderia ter sido uma decisão arriscada. Afinal, juros baixos, pelos manuais de economia, estimulam a atividade econômica. Ora, há na "euroland" países que, de fato, necessitam de estímulo porque seu crescimento em 1998 patina abaixo de 1%. Mas há outros (a Irlanda, por exemplo) cujo nível de atividade está em alturas asiáticas (dos bons tempos), com crescimento superior a 6%.
Juros baixos, nessas circunstâncias, tendem a ser combustível para a inflação, justamente o que Duisenberg tem a obrigação de manter sob controle.
Mas o presidente do BCE acha que "a abertura da economia européia, com comércio totalmente livre e crescente competição, pode manter sob controle tendências inflacionárias em várias regiões".
Outro exemplo de "águas jamais navegadas" está dado pela própria composição do banco: são seis membros da diretoria-executiva, todos sediados em Frankfurt, na Alemanha, mas procedentes de seis diferentes países.
A eles, somam-se os 11 presidentes dos Bancos Centrais nacionais, que se transformam em uma espécie de diretorias regionais do novo Banco Central Europeu. Fazer 17 pessoas raciocinarem como europeus, e não como alemães ou finlandeses, não é uma tarefa trivial.
Como tampouco será fácil para o BCE demonstrar que é pelo menos tão independente quanto o legendário Bundesbank (o Banco Central alemão). Ainda mais que os políticos que governam a Europa estão defendendo o que chamam de "diálogo" entre os governos e o BCE, uma fórmula suave para interferir sem explicitar uma violação à independência do banco. (CLÓVIS ROSSI)



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice



Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita do Universo Online ou do detentor do copyright.