|
Próximo Texto | Índice
RETRATO DO BRASIL
FOSSO SOCIAL
Renda média continuou estagnada em 2004, porém mais abonados perderam e pobres ganharam um pouco, diz pesquisa do IBGE
Rico empobrece, e desigualdade diminui
ANTÔNIO GOIS
PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO
No ano passado, o trabalhador
brasileiro viu sua renda ficar estagnada em comparação com
2003, mas percebeu um aumento
no número de empregos e uma
pequena redução da desigualdade. Essas são as principais conclusões da Pnad (Pesquisa Nacional
por Amostra de Domicílios) de
2004, divulgada ontem pelo IBGE.
Segundo o instituto, o número
de empregos aumentou 3,3% em
relação a 2003, acréscimo de 2,7
milhões de trabalhadores ocupados no segundo ano do governo
Lula. A taxa de desemprego caiu
de 9,7% para 9%, o equivalente a
8,2 milhões de desempregados.
Esse aumento de 3,3% foi o segundo melhor da série histórica
iniciada em 1992. Ele só não foi
mais positivo do que o verificado
de 2001 para 2002, último ano do
governo FHC, quando houve alta
de 3,8% no número de ocupados.
Mas a renda média do trabalhador permaneceu estagnada em R$
733, já descontada a inflação do
período. Com isso, ainda não foi
naquele ano que o trabalhador
começou a recuperar a perda de
18,8% verificada desde 1996,
quando a renda atingiu seu pico e,
desde então, só caiu.
Mesmo sem crescimento na
renda, a queda no rendimento
dos mais ricos, o recuo da inflação
e o aumento real do salário mínimo permitiram uma melhor distribuição da renda do trabalho.
A renda média cresceu 3,2% para a metade dos trabalhadores
que ganham menos. Nos 50% que
ganham mais, no entanto, ela caiu
0,6%. Se forem considerados apenas os 5% de trabalhadores de
mais alta renda no ano passado, a
queda foi ainda maior, de 1,6%.
Como a renda dos que ganham
menos subiu ao mesmo tempo
em que caiu a dos mais ricos, melhorou um pouco a distribuição
da renda do trabalho.
O índice de Gini, que avalia a
concentração de renda, passou de
0,554 em 2003 para 0,547 em 2004
(quanto mais perto de 1, mais desigual é o rendimento; quanto
mais próximo de zero, melhor é a
distribuição). Esse é o melhor resultado desde 1981.
Desde 1993, esse indicador de
distribuição de renda no país
mantém uma tendência constante de melhora, mas essa evolução
aconteceu, de um modo geral, à
custa da queda do rendimento
dos mais ricos.
De 1996 a 2004, a renda média
dos 10% com maiores ganhos
caiu 22,7%. A renda desse contingente vem caindo todos os anos,
inclusive em 2004. No mesmo período, o rendimento médio dos
50% de trabalhadores com menor
renda teve uma queda menor, de
4,31%. É por essa razão que, apesar desses dois grupos terem perdido, a distribuição de renda melhorou um pouco, já que os mais
pobres perderam menos do que
os mais ricos.
Para Eduardo Nunes, presidente do IBGE, ainda há um caminho
longo a se percorrer para a eqüidade de renda no país. "A distribuição tem evoluído ano a ano,
mas num ritmo ainda muito lento. A concentração de renda aqui
ainda é muito elevada para países
de renda [PIB] compatível com a
do Brasil", disse.
Para João Sabóia, diretor do Instituto de Economia da UFRJ, a redução gradual da concentração
de renda no Brasil é um fato positivo, ainda que tenha ocorrido em
razão da perda dos mais ricos.
"O ideal seria que o índice de Gini melhorasse com todos ganhando, mas com os pobres ganhando
relativamente mais do que os ricos. Mas também não é ruim que
os mais ricos tenham perdido um
pouco. De todo modo, é um processo de redistribuição de renda.
Mesmo que a distribuição tenha
melhorado continuamente, a renda ainda é muito concentrada no
Brasil. Poucos países do mundo
ainda têm um grau de concentração como o nosso", disse Sabóia.
Para Sônia Rocha, economista
da Fundação Getulio Vargas, essa
melhora na distribuição de renda,
somada ao aumento do salário
mínimo e à ampliação da massa
de salários (já que o emprego
cresceu, ainda que a renda tenha
ficado estável) deve ter impacto
sobre a redução da pobreza no
Brasil. "Ainda não dá para afirmar seguramente porque é preciso ver os microdados da Pnad,
mas meu palpite é que em 2004
houve uma pequena diminuição
da pobreza", disse.
Emprego
A taxa de desemprego caiu porque o número de vagas criadas
cresceu mais do que o total de
pessoas que ingressaram no mercado de trabalho. A PEA (População Economicamente Ativa) subiu 2,5%, e a ocupação, 3,3%.
Em 2004, foram criados num
ritmo forte tanto empregos sem
carteira (crescimento de 6%) como com carteira (6,6%). Mas
houve uma tendência de formalização porque as contratações registradas (1,569 milhão) superaram as informais (1,126 milhão).
Já o número de trabalhadores
por conta própria aumentou bem
menos (0,6%), o que fez a categoria perder participação no total de
pessoas ocupadas. Na esteira da
menor evolução do trabalho por
conta própria, o emprego sem remuneração, no qual se insere, por
exemplo, aquele membro da família que auxilia na banca do camelô ou na birosca da família, cedeu 4,5% de 2003 para 2004. Já o
emprego doméstico, puxado pelas contratações sem registro, subiu 4,2%. Também aumentou acima da média o emprego de servidores e militares, em 4,4%.
A participação dos trabalhadores formais foi de 32% em 2003
para 32,9% em 2004. A dos sem
carteira aumentou de 23,5% para
24,1%, enquanto a dos que trabalham por conta própria caiu de
22,3% para 21,8%. Já a participação dos não-remunerados caiu de
7,1% em 2003 para 6,5% em 2004.
Em 1992, eram 10,5% do total de
empregados.
Por setores, foi a indústria que
alavancou o emprego, com crescimento de 6,6%, seguida por serviços 4,8%. No setor agrícola, houve
queda de 0,5%. Ao todo, fora das
atividades desenvolvidas no campo, o emprego cresceu 4,3% em
atividades não-agrícolas.
Próximo Texto: Trabalho: Mercado se fecha para os menos instruídos Índice
|