UOL


São Paulo, segunda-feira, 28 de abril de 2003

Próximo Texto | Índice

Transgênico deve monopolizar debate


Liberação da safra de soja transgênica neste ano e rotulação de produtos modificados devem ser discutidos

Mercado mundial de commodities ainda não paga mais pela soja não modificada produzida no Brasil



LUIZ ROLLO
DAS REGIONAIS

O tema dos transgênicos deve monopolizar o debate da 10ª Agrishow, que começa hoje em Ribeirão Preto. Depois da medida provisória 113, que liberou a comercialização da safra de soja transgênica produzida ilegalmente no país, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) baixou um decreto, publicado na sexta-feira no "Diário Oficial" da União, determinando a rotulagem dos produtos que contenham organismos geneticamente modificados.
A polêmica sobre a liberação do cultivo dos transgênicos no Brasil está ligada principalmente à produção da soja. Alguns produtores afirmam que a versão transgênica da soja é mais rentável. Do outro lado, pesquisadores defendem a realização de mais testes com a soja modificada e destacam a vantagem competitiva de manter a plantação de não-transgênicos.
Blairo Maggi, governador de Mato Grosso e um dos maiores produtores do Brasil, afirma que os EUA não perderam mercado por plantarem transgênicos.
"Alguns países, como os escandinavos, têm preferência pela soja não-transgênica. Mas a China e o Japão, por exemplo, compram soja norte-americana transgênica. Existe um mercado para a soja não-transgênica? Existe, e ele é grande, mas também existe mercado para a soja transgênica."
Para Maggi plantar soja não-transgênica ainda não é um diferencial de rentabilidade para o produtor. "Tivemos alguma vantagem comercial nos últimos anos por não termos soja transgênica, mas isso não é o fator determinante para a preferência do mercado pela soja brasileira. Se olharmos o produto físico, compararmos o grão brasileiro com o americano, a soja brasileira é de melhor qualidade. Tem maior quantidade de proteína e de óleo, é pouco, mas é significativo no processo industrial", afirma.
"Hoje existe um custo de produção no Brasil ao redor de US$ 30 por hectare de soja produzido. Custa mais caro plantar a soja que cultivamos do que a transgênica. Se os países consumidores de soja não quiserem comprar o grão transgênico, alguém tem de indenizar pelo que o produtor brasileiro gasta a mais, mas o mercado não está disposto a pagar a mais pela soja não-transgênica."

Vantagem
Impedir o plantio de soja transgênica no Brasil pode ser uma vantagem comercial para o país. É o que sustenta o geógrafo do Instituto de Estudos Avançados da USP (Universidade de São Paulo) Aziz Ab'Sáber. "Transgênicos agrícolas, extensivos, no momento em que o mundo inteiro prefere e busca o produto natural é de um absurdo total para um país como o Brasil. Não podemos adotar transgênicos para a soja em hipótese nenhuma, porque já se percebeu que a força que nós temos é produzir soja natural."
Segundo Ab'Sáber, a grande vantagem da soja produzida no Brasil é justamente estar livre de genes modificados. "Se adotarmos a soja transgênica, eles [norte-americanos] e nós [brasileiros] vamos competir apenas no preço. Se nós conservamos a soja natural, podemos competir em todos os mercados do mundo, por isso é que há empresas que estão forçando o Brasil a adotar a soja transgênica. Não se pode mudar uma coisa que é um trunfo."
Para o produtor mato-grossense Guido Dalastra, o mercado para a soja não modificada não existe. "Se houvesse um mercado de soja não-transgênica, nós seríamos remunerados pelo nosso diferencial. O que vale é o preço da soja na Bolsa de Chicago."
Para Dalastra, a liberação da soja transgênica no país poderia trazer a valorização do produto não modificado, que, segundo ele, continuaria a ser produzido.
Maggi também afirma que o mercado aproveita o fato de, no Brasil, não haver soja modificada. "O mercado sabe que aqui não tem soja modificada e está aproveitando o fato. Não paga nada a mais para ter esse diferencial."
Para o engenheiro de alimentos e pesquisador da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) Luiz Eduardo Carvalho, um dos problemas no debate sobre os organismos geneticamente modificados é a guerra de informações que envolve a discussão.
"Estamos tratando de um assunto em que há entusiastas e militantes. Há os entusiastas da genética, das multinacionais, do lobby, da grana, e, do outro lado, tem os militantes contra os transgênicos. Todos agem com advogados, defendem cada um o seu lado. E os dois lados mentem."
Dalastra acredita que o debate sobre o perigo dos organismos geneticamente modificados é "ideológico". "É muito mais ideologia esse debate sobre transgênicos do que pesquisa científica."


Próximo Texto: Tecnologia: Unesp pesquisa transgênico de terceira geração
Índice

UOL
Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita do Universo Online ou do detentor do copyright.