São Paulo, domingo, 28 de setembro de 2008

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SEGURANÇA

Morador se sente seguro em bairro violento

No Jaçanã, o risco de violência é de 34%, mas a sensação de insegurança é de 26%; Moema tem risco de 9%, mas 18% se sentem inseguros

Henrique Marenza/Folha Imagem
Lanças protegem casa na Brasilândia (noroeste); para especialistas, morador de região violenta tem maior tolerância à violência

TALITA BEDINELLI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Na rua de Odair de Oliveira, no Jaçanã, um vizinho matou os tios, outra vizinha e o cachorro dela e depois se matou. Tempos depois, um ladrão entrou armado na padaria da esquina quando ele estava comprando pão. Em outra ocasião, ele também sofreu uma tentativa de assalto à mão armada.
Mesmo colecionando histórias de violência no distrito onde mora há 57 anos, Odair, vice-presidente do Conseg (Conselho Comunitário de Segurança) do Jaçanã, diz sentir-se seguro.
Já a farmacêutica Cynthia Sack, 40, que nunca foi assaltada no bairro, diz que não anda sozinha à noite pelas ruas por medo de ser assaltada. Ela mora em Higienópolis (centro).
Esses dois casos exemplificam bem uma contradição captada pela pesquisa Datafolha: moradores das regiões mais violentas da cidade sentem-se seguros onde moram; os de áreas menos violentas, não.
A pesquisa perguntou a moradores dos 96 distritos de São Paulo se eles foram assaltados, roubados ou agredidos no último ano no bairro; se, no mesmo período, alguém entrou na casa deles e roubou ou tentou roubar algo; se sofreram algum seqüestro relâmpago nos últimos doze meses no bairro e se tiveram parente ou amigo assassinado no último ano no bairro. Também foi perguntado a eles qual o grau de segurança que eles sentem ao andar depois de escurecer pelas ruas próximas ao local onde moram.
No Jaçanã, 34% disseram ter sofrido algum dos quatro episódios de violência -maior percentual da cidade. Mas 26% se disseram muito inseguros nas ruas à noite -valor que coloca o distrito atrás de outros cinco.
Na Consolação, distrito em que fica Higienópolis, apenas 13% foram vítimas de alguma das agressões citadas, mas 20% se disseram muito inseguros.
"A sensação de insegurança e o medo são formados por outras coisas além da experiência individual. Os conhecidos terem passado por uma situação de violência e um discurso do medo construído na cidade influenciam de maneira determinante essa percepção", diz Paula Miraglia, diretora-executiva do Ilanud (Instituto Latino Americano das Nações Unidas para Prevenção do Delito e Tratamento do Delinquente).
"Às vezes, uma pessoa sofreu um episódio anos atrás e as marcas ficaram", completa a coordenadora-adjunta do NEV (Núcleo de Estudos da Violência da USP), Nancy Cardia.
Para ambas, em regiões onde a violência é mais freqüente, ela pode ser mais tolerada pelos moradores. "Alguns grupos podem achar isso absolutamente intolerável. Em outros, por acontecer tanto, com tanta freqüência e ser tão inescapável, pode ser que o medo seja menor", afirma Cardia.
O fato pode ser observado em Capão Redondo (extremo sul), segundo local com maior número de homicídios em São Paulo no segundo trimestre de 2008, segundo o Mapa da Violência publicado pela Folha no mês passado. Na pesquisa do Datafolha, o distrito tem o segundo maior risco de violência (30%) e uma percepção de insegurança de 20%. A porcentagem é menor que a de Moema (zona sul), onde 21% disseram sentir-se muito inseguros, apesar de o risco ser de apenas 9%.

Vizinhança
Para o vice-presidente do Conseg do Jaçanã, a segurança que ele sente no bairro é proporcionada pelos vizinhos. "Todo mundo conhece todo mundo, os vizinhos ficam de olho, se ajudam", explica.
"Em bairros onde se tem casas, as pessoas conhecem os vizinhos, a rotina da rua, sentem um maior controle da situação", concorda Cardia. "Onde você tem um grande número de prédios e maior anonimato, mais fácil para as pessoas se sentirem inseguras. É muito difícil saber quem é do bairro."
No Jaçanã, 94% moram em casas; no Capão Redondo, 89%.
Já na Consolação, esse número é de apenas 5% e, em Moema, de 18%.
Para se sentirem mais seguros, moradores de bairros mais ricos contam com vigias, janelas especiais e grades. "As pessoas não desistem das seguranças individuais privadas, mas isso não garante a segurança da cidade. Enquanto a cidade não estiver segura, ninguém vai estar", diz Miraglia.


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