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FUNCIONALISMO
Base petista, servidores cobram oito anos sem reajustes
WLADIMIR GRAMACHO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Luiz Inácio Lula da Silva acabara de subir ao palanque montado
na Esplanada dos Ministérios para seu último comício em Brasília,
antes de voltar à capital como presidente eleito. Cerca de 35 mil pessoas esperavam seu discurso. No
palco, o candidato foi interceptado por um líder sindical.
"Lula, quase todo mundo aqui é
funcionário público. Toma nossa
lista de reivindicações. Você precisa falar sobre isso agora", disse
Cláudio Santana, secretário-geral
do Sindicato dos Servidores Públicos Federais e candidato a deputado federal pelo próprio PT. A
mão estendida oferecia uma carta
com 5 mil assinaturas e um índice
de reajuste: 89%.
"Tenham um pouco de paciência", pediu Lula, constrangido. "Já
tivemos muita paciência nesses
oito anos. Agora queremos o reajuste", devolveu Santana, encerrando a conversa.
A cena ocorreu no início da noite do dia 28 de setembro, um sábado. O tom do curto diálogo indica em que ambiente Lula sentará, pela primeira vez, na cadeira
do empregador à mesa de negociações salariais. Do outro lado,
estarão 827 mil servidores da ativa
e 517 mil inativos, entre civis e militares do Executivo. A data do encontro: janeiro de 2003, primeiro
mês do governo Lula e data-base
do funcionalismo.
Os servidores cobram uma fatura de oito anos sem reajustes para
o servidor comum da Esplanada.
Todos podem ser beneficiados,
ainda que algumas categorias, como os auditores fiscais, tenham
obtido reajustes específicos. Calculam, com base no INPC do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), que o reajuste
devido entre janeiro de 1995 e janeiro de 2002 é de 89%.
"O companheiro Lula precisa
dar uma resposta à nossa reivindicação. Até agora foram só evasivas. Dizer que vai sentar para negociar não interessa. Não tem
pacto de submissão, não", avisa
Cláudio Santana.
Na ponta do lápis, o aumento
salarial de 89% para todos os servidores do Executivo custaria R$
49 bilhões a mais, por ano, aos cofres públicos. É mais que o dobro
da arrecadação da CPMF estimada pelo governo para 2003. Para
pagar a conta sem aumentar o déficit fiscal, seria preciso, grosso
modo, triplicar a alíquota da contribuição sobre movimentações
financeiras. Elevá-la, por exemplo, dos atuais 0,38% para 1,14%.
"Como o partido conta com sólidas bases entre os funcionários,
os sindicatos tendem a esperar
que os governantes do PT concedam rapidamente aumentos salariais. Se o partido cede, corre o risco de inviabilizar as finanças. Caso não ceda, tem que se haver com
funcionários particularmente
agressivos", escreveu o cientista
político André Singer, porta-voz
de Lula, em seu livro sobre o PT.
Com razão. As experiências de
governos do PT no Espírito Santo
e no Distrito Federal, por exemplo, revelaram sindicatos como os
principais adversários das administrações de Vítor Buaiz e Cristovam Buarque.
Além disso, a base do PT no
Congresso é, antes de tudo, uma
base sindical. Dos atuais 58 deputados federais do partido, 33 foram dirigentes de sindicatos ou
da CUT. Entre os oito senadores,
quatro vêm do sindicalismo.
"Sempre evitamos atritos com
sindicatos. Mas na hora da votação, fechamos com o partido", diz
o deputado Walter Pinheiro (PT-BA), ex-presidente do Sindicato
dos Trabalhadores em Telecomunicações (Bahia).
Em 2002, os sindicatos também
evitaram atritos com o PT. "Por
orientação da CUT, a maioria das
categorias profissionais antecipou as negociações por reajustes
para evitar o período eleitoral",
diz o secretário-geral da entidade,
Duvanier Ferreira. "Assim, os dirigentes sindicais ficariam mais
livres para se envolver na campanha", explica. "Mas em nenhum
momento imaginou-se usar isso
para prejudicar o Lula."
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