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ADIB JATENE
Tecnologia versus falta de leitos
São Paulo é o maior centro
de referência em saúde no
país, concentrando enorme arsenal de alta tecnologia, tanto em
diagnóstico quanto em tratamento. Não fica nada a dever aos mais
avançados centros do mundo. Entretanto grande parcela da população tem dificuldades de acesso
até para atendimento básico.
Essa distorção fica clara quando
se analisa a distribuição dos leitos
hospitalares na cidade de 10 milhões de habitantes, dividida em
96 distritos. Em 25 distritos, onde
vivem 18,5% da população, existem 13 leitos por mil habitantes. Os
outros 71 distritos, que concentram 81,5% das pessoas, contam
com apenas 0,6 leito por mil habitantes.
Essa brutal distorção, que dificulta o acesso da grande parcela
da população, está no bojo da crise
orçamentária que afeta o país nos
três níveis de governo.
As áreas mais ricas da cidade
concentram a população mais diferenciada, que consegue pagar
-direta ou indiretamente, por
vários tipos de sistemas de pré-pagamento- pela assistência prestada. Isso levou à construção, nos
últimos 50 anos, de rede privada
hospitalar e ambulatorial que
concentra a maior parte do setor
de alta tecnologia, tanto de diagnóstico como de tratamento.
Instituições privadas lucrativas e
não-lucrativas, mantidas por pessoas ou coletividades descendentes
de imigrantes, destinam-se, quase
exclusivamente, à parcela da população que não utiliza o sistema
público de saúde.
As áreas mais pobres da cidade
dependem, basicamente, dos hospitais públicos e de poucos hospitais privados filantrópicos, que vivem em situação pré-falimentar.
As perdas ao longo dos anos podem ser corretamente apreciadas
quando se constata que os gastos
federais com saúde, que em 89 representavam US$ 11,5 bilhões, reduziram-se, em 2002, para menos
de US$ 10 bilhões. Enquanto isso, a
população teve um acréscimo de
quase 15 milhões de pessoas.
A expectativa de melhoria, pela
aprovação em 2000 da emenda 29,
que vincula recursos federais, estaduais e municipais, não pode ser
frustrada pela destinação de recursos originalmente do Ministério da Saúde para programas de
infra-estrutura ou de assistência
social. É uma pena que isso ocorra
quando uma equipe de profissionais da melhor qualificação, comprometidos historicamente com o
sistema público de saúde, ocupa o
ministério e luta para honrar
compromissos penosamente conquistados e assumidos com a população.
Espero que a sensibilidade do
presidente Lula e do seu ministro
da Fazenda -que, aliás, é médico- não permita mais uma frustração, entre tantas já vividas pelo
sistema público de saúde.
Adib Jatene, cardiologista, é diretor-geral do Hospital do Coração. Foi duas vezes ministro da Saúde e uma vez secretário da Saúde do Estado de São Paulo.
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