São Paulo, domingo, 30 de julho de 2006

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poder vermelho

China reforça Exército e sai à caça de petróleo, metais e tecnologia

Empresas chinesas realizam aquisições em todo o mundo com três alvos estratégicos: suprimento de energia, marcas globais e novas tecnologias

CLÁUDIA TREVISAN
DA REPORTAGEM LOCAL

O mundo se surpreendeu em dezembro de 2004, quando a chinesa Lenovo, pouco conhecida no Ocidente, comprou a divisão de computadores pessoais da norte-americana IBM.
Mas é bom se acostumar, porque negócios como esse serão cada vez mais freqüentes, na medida em que a China internacionaliza sua economia e busca quantidades crescentes de matérias-primas e energia para alimentar sua expansão.
As empresas chinesas estão saindo pelo mundo atrás de aquisições que garantam três objetivos estratégicos: suprimento de recursos naturais, principalmente petróleo e minérios, acesso à tecnologia e conquista de marcas consagradas. "As aquisições são um atalho para empresas chinesas terem presença global", afirma Laixiang Sun, da Escola de Estudos Orientais da Universidade de Londres.
Em alguns casos, as aquisições contam com o apoio do espetacular volume de reservas internacionais da China, que superaram as do Japão e somam US$ 941 bilhões -mais que todo o PIB do Brasil.
Segundo Laixiang, o governo não utiliza esses recursos diretamente, mas dá empréstimos a baixíssimas taxas de juros, principalmente para as empresas estatais de petróleo.
A segurança energética e a busca de recursos naturais estão no topo das preocupações do governo chinês e moldam a política externa do país, destaca David Zweig, diretor do Center on China's Transnational Relations, de Hong Kong.
A China é o segundo maior consumidor de petróleo do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos, e compra quantidades crescentes de minério de ferro, cobre, níquel e alumínio.
Problemas no fornecimento desses produtos podem ameaçar o vertiginoso ritmo de expansão da economia -cerca de 40% do petróleo consumido no país é importado, e a voracidade chinesa é apontada como um dos fatores que contribuíram para a alta do produto nos últimos dois anos.
"A China precisa criar 9 milhões de empregos por ano, possui uma classe média que quer dirigir carros e está comprando apartamentos, em meio a um enorme boom imobiliário. Para tudo isso, necessita energia e recursos naturais", observa Zweig.

Poder de veto
Na caça ao petróleo, a China não enfrenta as restrições político-ideológicas que, ao menos formalmente, limitam a atuação dos Estados Unidos no tabuleiro internacional.
O antigo Império do Meio é um dos cinco países com assento no Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas), ao lado dos EUA, França, Inglaterra e Rússia.
Nessa condição, não hesita em usar seu poder de veto para dificultar a adoção de sanções contra países vistos como párias pelos norte-americanos, como Sudão e Irã, grandes produtores de petróleo.
Nada menos que 60% das exportações do Sudão são destinadas à China, que cultua relações cordiais com o governo iraniano -o presidente Mahmoud Ahmadinejad esteve em junho na China e se encontrou com seu colega chinês, Hu Jintao. Juntos, Sudão e Irã respondem por cerca de 20% das importações de petróleo da China.
Ao mesmo tempo em que cultua relações diplomáticas com fornecedores, Pequim intensifica as aquisições e investimentos em petroleiras no exterior. O mais recente movimento foi da Sinopec, segunda maior produtora de petróleo da China, que comprou por US$ 3,5 bilhões uma subsidiária da British Petroleum na Rússia, no fim de junho.
As investidas realizadas desde o ano passado incluem negócios na Nigéria (US$ 2,27 bilhões, em janeiro de 2006), Cazaquistão (US$ 4,2 bilhões, em outubro) e Equador (US$ 1,42 bilhão, em setembro).
As aquisições recentes vão engordar as estatísticas de investimentos chineses no exterior, que cresceram em ritmo acelerado desde 1990.
Naquele ano, a China tinha um estoque de US$ 4,5 bilhões investidos em outros países, comparados a US$ 38,5 bilhões do Brasil. Em 2004, segundo a Unctad, os investimentos brasileiros tinham crescido 67% em relação a 1990, para US$ 64,4 bilhões, enquanto os chineses deram salto de 762%, para US$ 38,8 bilhões.

Forças Armadas
Ao mesmo tempo em que globaliza seu capital, a China fortalece seus músculos militares. Desde os anos 90, o governo de Pequim investe na modernização do Exército de Libertação Popular, a maior força militar do mundo, com 2,25 milhões de integrantes.
Potência nuclear desde 64, a China vem aumentando a cada ano os investimentos em suas Forças Armadas, dando prioridade ao desenvolvimento tecnológico. Em 2006, o orçamento para o setor aumentou 14,7%, para US$ 35 bilhões.
O fortalecimento militar e o fato de que as aquisições de petroleiras no exterior são todas realizadas por empresas estatais dão aos chineses uma condição especial para perseguir sua segurança energética.
Na avaliação de Zweig, há uma estreita coordenação entre o governo chinês e as estatais, que não existe no caso dos Estados Unidos. Outra diferença é o acesso a financiamento farto e barato.
"Os dois países elevaram a questão energética a um patamar prioritário, mas a China tem melhores condições de fazer disso uma política estratégica", ressalta Zweig.


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