Índice geral Esporte
Esporte
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Órfãos

Mudança no trajeto faz público que se acostumou a assistir à São Silvestre da janela de casa ficar sem a corrida pela primeira vez desde 1980

Leticia Moreira/Folhapress
A aposentada Zenaide Rosa, que não verá mais os atletas da São Silvestre passarem no Minhocão
A aposentada Zenaide Rosa, que não verá mais os atletas da São Silvestre passarem no Minhocão

DE SÃO PAULO

Zenaide Rosa não se esquece do dia 31 de dezembro de 15 anos atrás, quando uma multidão de gente fantasiada passou correndo, pulando e gritando sob a janela de seu pequeno apartamento na região central de São Paulo.

Pela primeira vez, ela viu se colorir o elevado Costa e Silva, conhecido como Minhocão, via expressa erguida acima da superfície entre dezenas de prédios residenciais.

Eram os milhares de participantes da São Silvestre, de quem a aposentada de 61 anos fala com um misto de intimidade e admiração.

"Tem o noiva, o 'superman', os chifrudos, gente que eu vejo de perto todo ano. E aqueles africanos. Todo mundo torce pelo Brasil, mas eles ganham sempre", afirma.

Gente que ela não verá hoje porque a São Silvestre mudou seu tradicional percurso e não vai mais ao Minhocão, por onde passa desde 1980, segundo os organizadores.

Outras áreas também foram excluídas. Na rua Margarida, perto da av. Pacaembu, um casal de idosos costumava reunir a família no último dia do ano para uma tradição que a maioria dos participantes da São Silvestre conhece.

Munidos de mangueiras, eles e seus vizinhos espirravam água ao alto de maneira a aliviar o calor de quem alcançava a metade da corrida.

"Esse pessoal sempre me ajudou, mas eu nunca soube o nome deles", afirma o veterano Nelson Evêncio, que corre a São Silvestre desde 1995.

"Seu Jessé e dona Maria morreram. Ele, neste ano, ela, no ano passado", diz a dona de casa Neli de Bernarde, 75, vizinha do casal havia 43 anos e que sempre viu a prova da porta de casa. "Pena que não seja mais aqui", lamenta. "Era o acontecimento, vinha toda a família ver."

A mudança da São Silvestre também deixou órfãos clientes de bares e lanchonetes que tradicionalmente se reuniam para ver a corrida.

Neusdete Freitas, 58, gerente da lanchonete Ponto Chic, no largo Padre Péricles, que também saiu do percurso, diz que todos têm lamentado a mudança. "Ficávamos abertos até a corrida passar, o movimento era grande."

O distanciamento em relação ao público tradicional e a mudança no local da chegada -que saiu da av. Paulista e será perto do parque Ibirapuera- levou alguns corredores a abandonar a São Silvestre como protesto.

"Só corro de novo se voltar a ser como era antes", declara Evêncio, que também é treinador de corredores e preside associação da categoria.

A organização da corrida justificou a mudança do percurso como uma forma de permitir à São Silvestre crescer em número de participantes nos próximos anos.

Os organizadores dizem que isso seria impossível se a chegada ainda coincidisse com a festa de Réveillon da av. Paulista. Novas mudanças são estudadas para as próximas edições. (ADRIANO WILKSON, LUCAS REIS E RAFAEL REIS)

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.