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José Roberto Torero

Polícia x Torcida

O massacre de torcedores no Egito não deveria estar na página de esportes, mas na de política

Massacres em estádios de futebol por conta das forças policiais não é algo inédito. Há 11 anos, em Gana, ainda sob a ditadura militar de Jerry Rawlings, a polícia usou gás e trancou o estádio para conter uma briga de torcedores, matando 123 pessoas. Retrocedendo mais 11 anos, temos outros 62 mortos, dessa vez na Somália, quando a segurança do ditador militar (sempre eles) Mohamed Siad Barre fez disparos e provocou pânico na multidão.

O mais recente conflito aconteceu na última quarta-feira, no Egito, quando morreram 74 pessoas. E novamente a polícia é vista como culpada. Desta vez, por omissão. Ela teria deixado que os torcedores do time da casa, o Al Masry, invadissem o campo no final da partida. Os jogadores do Al Ahly conseguiram se esconder no vestiário. Mas não seus torcedores.

O que explicaria a omissão da polícia é que os torcedores do Al Ahly estiveram na linha de frente da revolução que derrubou o ditador Hosni Mubarak.

Além disso, dois dias antes do massacre, a torcida do Zamalek, histórico rival do Al Ahly, havia emitido um comunicado propondo uma trégua entre torcidas "pelo bem do Egito". Ou seja, as organizadas iriam se unir contra o regime militar, já que Mubarak acabou substituído por um tal Conselho Supremo das Forças Armadas (CSFA).

Curiosamente, durante o jogo de quarta-feira, a torcida do Masry teria cantado hinos a favor do CSFA.

Por fim, há poucos dias, o CSFA propôs a continuação do estado de emergência. Ou seja, a confusão seria duplamente benéfica para eles: criariam uma situação caótica para se manter no poder e enfraqueceriam forças contrárias. Um belo golpe. Se é que há golpe belo.

Aqui no Brasil, temos tristes mortes isoladas, mas não lutas campais e massacres. Alguma coisa funciona por estas bandas. Talvez a polícia seja mais bem treinada, talvez nossas organizadas sejam, quem diria?, mais civilizadas.

Mas isso ainda é pouco. O Brasil poderia ser o país de ponta nesta questão. Se já não temos o futebol mais bonito, poderíamos ter pelo menos a melhor torcida. Para isso, as organizadas teriam que se unir e acabar de vez com as brigas. Então poderiam até sentar lado a lado. E, passo final, poderiam deixar de existir.

Mas acreditar nisso seria acreditar que o Estado acabaria consigo mesmo, como alguns anarquistas e comunistas acreditam.

Talvez seja mais sensato aceitarmos que somos umas bestas e precisamos ser policiados.

Talvez não.

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