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Cidade no interior da Etiópia ganha oito ouros e filme

RODRIGO MATTOS
DE SÃO PAULO

"La, la. La, la." A palavra -que significa relaxe- é repetida seguidamente pelo técnico Sentayehu Eshetu a meninos e meninas entre 12 e 20 anos em treinos para corridas de longa distância.

Sob suas ordens, e risos, os jovens movimentam braços e pernas em exercícios em meio a montanhas verdes.

A cena se passa na cidade de Bekoji, na Etiópia, e faz parte do documentário "Town of Runners", que será lançado hoje no Reino Unido. Não há previsão de lançamento no Brasil, mas deve haver venda pela internet.

O filme retrata o local onde nasceram quatro campeões olímpicos, como Kenenisa Bekele, 5 mil e 10 mil metros masculino, e Tirunesh Dibaba, 5 mil e 10 mil metros feminino, em Pequim.

Juntos, os corredores de Bekoji levaram oito ouros nos últimos cinco Jogos. Todos treinaram com o técnico Eshetu quando jovens.

A cidade tem 16.730 habitantes. Ou seja, sua média é de um topo do pódio por cada 2.091 pessoas lá nascidas.

No mesmo período, desde Barcelona-92, o Brasil ganhou 13 ouros. Assim, obteve um topo do pódio por cada 14,7 milhões de habitantes.

Não há apoio financeiro forte ao programa de corrida do técnico Eschetu e Bekoji, que não conta com um centro de treinamento moderno.

O treinador sequer era especializado em corrida. Era, na verdade, praticante de futebol e chegou à cidade como professor da escola.

O que ele encontrou em Bekoji foram paisagens agrárias, em que a maioria da população é pobre e vive do trabalho no campo.

Havia, é fato, a altitude de 2.800 metros, que acostuma os atletas ao ar rarefeito e os leva a ter mais fôlego em terrenos mais baixos.

Foi lá que o técnico treinou sua primeira campeã olímpica, Demartu Tulu, ouro nos 10 mil metros feminino nos Jogos de 1992 e 2000.

"Então, eu me convenci que, se trabalhasse duro, poderia produzir muitos atletas em Bekoji", explica Eschetu no documentário.

O primeiro exemplo de sucesso criou uma cultura de corrida na cidade, cujos pais passaram a ver no esporte a chance na vida dos filhos.

"Na nossa cidade, as crianças acordam muito cedo para correr e seus pais não ficam surpresos", conta o técnico, que treina 200 jovens. "Em outra cidade, perguntariam: 'Vocês estão loucos?'"

O filme retrata as corridas de Dibaba assistidas em salas repletas em Bekoji. E mostra as crianças que se espelham nela para o sucesso.

"Só ser mãe de muitos filhos é uma vida muito dura. Não quero isso", afirma a corredora Allemi Tsegaye, 15.

Se bem-sucedidos, os atletas vão a clubes de corridas na capital da Etiópia. A outra opção é o casamento, como diz a mãe de uma das atletas.

Nesse ambiente, nenhuma das corredoras aparece relaxada no documentário. Apesar dos pedidos do técnico.

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