São Paulo, quinta-feira, 01 de junho de 2000


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FUTEBOL
Gols esquisitos

SONINHA
COLUNISTA DA FOLHA

Pela maneira como o Corinthians jogou no Morumbi na terça-feira à noite, era previsível que fizesse quatro gols. O que nem o palmeirense mais otimista acreditava era que o seu time conseguisse marcar três. E ninguém no mundo poderia supor que uma partida de jogadas tão bonitas tivesse tantos gols esquisitos, quase ridículos.
O Corinthians dominou desde o começo, enquanto o Palmeiras dava a impressão de estar dormindo em campo, distraído, desanimado, abatido. Edu, Vampeta, Ricardinho, Marcelinho, Edílson e Luizão , em dia inspirado, driblavam, fintavam e entravam na área do Palmeiras com incrível facilidade.
A estratégia era avassaladora: eles vinham de todos os lados, tocando a bola rapidamente, se revezando nas tarefas de servir e concluir. O Palmeiras também criou boas oportunidades no início, mas as conclusões eram chutinhos inofensivos. Alex enfileirava três ou quatro no meio-de-campo e até o Galeano dava "olé", mas quando o time perdia a bola era um deus-nos-acuda.
Quando o Corinthians fez 3 a 1 e a tragédia já se desenhava para o lado do Parque Antarctica, os dois melhores jogadores do lado verde, Alex e Júnior, tiveram a justa recompensa pelos seus esforços e diminuíram a diferença.
Pena é sempre um leão em campo, e Rogério ia muito bem até ser substituído (aliás, hoje em dia ele é um jogador muito mais inteligente e habilidoso do que no ano passado, quando foi convocado para a seleção). Mas quem melhor evitava o baile eram os canhotos das camisas 10 e 6.
O diagnóstico geral foi que os jogadores do Corinthians se cansaram ou se acomodaram depois de marcar os gols. Seria difícil mesmo manter aquele ritmo. De qualquer maneira, apesar dos escorregões e atentados à própria meta, das provocações (inevitáveis?) e da arbitragem frouxa, foi um jogão. Que me desculpem os jornalistas enfastiados com a "banalização" do confronto, mas clássico é clássico.

Quem nunca foi pra casa com a sensação de ter de ter feito um gol contra? De ter chutado um pênalti para fora, ou de ter tomado um frango? Todos nós temos momentos gloriosamente ridículos, como quem atirasse uma torta de chantilly contra a própria cara. Mas poucos têm um público tão numeroso para os seus tropeços como um jogador de futebol.
Às vezes eu falo besteiras que ficam vários dias revirando entre o estômago e a garganta. Como seria bom poder voltar atrás, retirar o que disse ou explicar melhor. Imagine o que é passar uma noite sendo Fábio Luciano, Argel, Roque Junior, Roberto Baggio, Zico ou qualquer outro jogador que tenha cometido um erro, e que seja responsabilizado pelo fracasso de um time. O torcedor pode dormir com a cabeça cheia, passar uma semana infernal, querer esquecer que gosta de futebol e se achar o sujeito mais infeliz do mundo, mas nada se compara à tristeza de quem pensa: "eu errei". "Eu estraguei tudo."
Eu já pensei que a praga mais horrível que se poderia rogar aos piores malfeitores da história seria a de se arrependerem profunda, amarga e intoleravelmente por tudo o que fizeram. Posso até torcer para que isso aconteça com jogadores desleais e dirigentes desonestos, mas para o zagueiro que se matou em campo e fez uma tremenda bobagem, desejo calma e paciência que isso passa.

Edmundo é um bom jogador, que nos seus melhores dias faz o que quiser com a bola. Mas será que este é o seu melhor momento?
Pensando bem, para jogar contra o Peru em uma partida de importância mínima, será que isso importa?

Antes do jogo, do lado de fora do estádio, uma equipe da MTV entrevistava torcedores tentar discutir a violência que tem cercado os jogos de futebol. A única surpresa, para mim, foi ouvir de quase todos, com a maior sem-cerimônia, que "tem mais é que dar porrada". Não pensei que fosse ouvir declarações tão explícitas.
Um ou outro tentava justificar: "a gente bate pra não apanhar", "a torcida só bate pra se defender". Mas com um pouco de insistência, eles admitiram que podem bater primeiro, como se fosse uma medida "preventiva" ou o troco por agressões passadas. Além da sinceridade, nada que eu não esperasse. O que eles menos gostariam de admitir é o que se percebe à primeira vista: são todos muito parecidos e dizem praticamente a mesma coisa. Como acontece em toda a sociedade, a culpa é sempre "do outro" e ninguém quer dar o primeiro passo. É um desafio para as organizadas manter esse pessoal sob controle. Uma coisa eles admitem: a violência não tem nada a ver com o futebol.
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soninha.folha@uol.com.br

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