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FUTEBOL
Gols esquisitos
SONINHA
COLUNISTA DA FOLHA
Pela maneira como o Corinthians jogou no Morumbi
na terça-feira à noite, era previsível que fizesse quatro gols. O que
nem o palmeirense mais otimista
acreditava era que o seu time
conseguisse marcar três. E ninguém no mundo poderia supor
que uma partida de jogadas tão
bonitas tivesse tantos gols esquisitos, quase ridículos.
O Corinthians dominou desde o
começo, enquanto o Palmeiras
dava a impressão de estar dormindo em campo, distraído, desanimado, abatido. Edu, Vampeta, Ricardinho, Marcelinho, Edílson e Luizão , em dia inspirado,
driblavam, fintavam e entravam
na área do Palmeiras com incrível facilidade.
A estratégia era avassaladora:
eles vinham de todos os lados, tocando a bola rapidamente, se revezando nas tarefas de servir e
concluir. O Palmeiras também
criou boas oportunidades no início, mas as conclusões eram chutinhos inofensivos. Alex enfileirava três ou quatro no meio-de-campo e até o Galeano dava
"olé", mas quando o time perdia
a bola era um deus-nos-acuda.
Quando o Corinthians fez 3 a 1 e
a tragédia já se desenhava para o
lado do Parque Antarctica, os
dois melhores jogadores do lado
verde, Alex e Júnior, tiveram a
justa recompensa pelos seus esforços e diminuíram a diferença.
Pena é sempre um leão em campo, e Rogério ia muito bem até ser
substituído (aliás, hoje em dia ele
é um jogador muito mais inteligente e habilidoso do que no ano
passado, quando foi convocado
para a seleção). Mas quem melhor evitava o baile eram os canhotos das camisas 10 e 6.
O diagnóstico geral foi que os
jogadores do Corinthians se cansaram ou se acomodaram depois
de marcar os gols. Seria difícil
mesmo manter aquele ritmo. De
qualquer maneira, apesar dos escorregões e atentados à própria
meta, das provocações (inevitáveis?) e da arbitragem frouxa, foi
um jogão. Que me desculpem os
jornalistas enfastiados com a "banalização" do confronto, mas
clássico é clássico.
Quem nunca foi pra casa com a
sensação de ter de ter feito um gol
contra? De ter chutado um pênalti para fora, ou de ter tomado um
frango? Todos nós temos momentos gloriosamente ridículos, como
quem atirasse uma torta de chantilly contra a própria cara. Mas
poucos têm um público tão numeroso para os seus tropeços como um jogador de futebol.
Às vezes eu falo besteiras que ficam vários dias revirando entre o
estômago e a garganta. Como seria bom poder voltar atrás, retirar
o que disse ou explicar melhor.
Imagine o que é passar uma noite
sendo Fábio Luciano, Argel, Roque Junior, Roberto Baggio, Zico
ou qualquer outro jogador que tenha cometido um erro, e que seja
responsabilizado pelo fracasso de
um time. O torcedor pode dormir
com a cabeça cheia, passar uma
semana infernal, querer esquecer
que gosta de futebol e se achar o
sujeito mais infeliz do mundo,
mas nada se compara à tristeza
de quem pensa: "eu errei". "Eu estraguei tudo."
Eu já pensei que a praga mais
horrível que se poderia rogar aos
piores malfeitores da história seria a de se arrependerem profunda, amarga e intoleravelmente
por tudo o que fizeram. Posso até
torcer para que isso aconteça com
jogadores desleais e dirigentes desonestos, mas para o zagueiro que
se matou em campo e fez uma tremenda bobagem, desejo calma e
paciência que isso passa.
Edmundo é um bom jogador,
que nos seus melhores dias faz o
que quiser com a bola. Mas será
que este é o seu melhor momento?
Pensando bem, para jogar contra o Peru em uma partida de importância mínima, será que isso
importa?
Antes do jogo, do lado de fora
do estádio, uma equipe da MTV
entrevistava torcedores tentar
discutir a violência que tem cercado os jogos de futebol. A única
surpresa, para mim, foi ouvir de
quase todos, com a maior sem-cerimônia, que "tem mais é que dar
porrada". Não pensei que fosse
ouvir declarações tão explícitas.
Um ou outro tentava justificar:
"a gente bate pra não apanhar",
"a torcida só bate pra se defender". Mas com um pouco de insistência, eles admitiram que podem
bater primeiro, como se fosse uma
medida "preventiva" ou o troco
por agressões passadas. Além da
sinceridade, nada que eu não esperasse. O que eles menos gostariam de admitir é o que se percebe
à primeira vista: são todos muito
parecidos e dizem praticamente a
mesma coisa. Como acontece em
toda a sociedade, a culpa é sempre "do outro" e ninguém quer
dar o primeiro passo. É um desafio para as organizadas manter
esse pessoal sob controle. Uma
coisa eles admitem: a violência
não tem nada a ver com o futebol.
E-mail
soninha.folha@uol.com.br
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