São Paulo, terça, 1 de julho de 1997.



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

JUCA KFOURI
O patriota

O país do futebol não saiu às ruas para comemorar o título de campeão da América.
Talvez porque o torcedor saiba que a seleção só enfrentou os reservas de times pouco cotados, que não teve adversários à altura, teve apenas a altura como adversária.
É possível que o povo brasileiro não tenha simpatia por sua seleção e, se for assim, Zagallo ajuda.
Incapaz de ser nobre até quando ganha, o treinador ameaçou que vamos ter de engoli-lo até a Copa da França.
Nada tão indigesto, até porque o estômago nacional está acostumado, mesmo depois de fracassos olímpicos ou de vitórias pouco significativas como as de Santa Cruz de La Sierra, para não falar de Oslo, na Noruega.
Por menos científica que seja, com uma amostragem que tende a concordar com sua linha, o "Cartão Verde" quis saber se os telespectadores aceitam engolir Zagallo mais um ano. Nada menos que 82% telefonaram para dizer não, embora saibam que o prato esteja feito e lhes será enfiado goela abaixo.
Zagallo imagina, ainda, ter o monopólio do patriotismo, imputando a quem o critica uma suposta falta de amor ao Brasil. Quanta bobagem!
Em 1970, no tri, e ele reconhece hoje, era tão alienado que nem sequer sabia que se torturava nos porões da ditadura que bajulava -e Tostão estava no grupo, falando nos limites possíveis, à época, das mazelas do país.
Em 1994, no tetra, Zagallo não levantou sua voz para evitar que o confundissem no famoso vôo da muamba.
E agora mesmo, com a autoridade de técnico mais importante do país, calou-se diante da virada de mesa do Campeonato Brasileiro.
E que esportista é esse que até hoje reclama da anulação do gol de Edmundo que nos tirou a Copa América de 1995 -esquecido do gol com a mão de Túlio contra a Argentina, que nos permitiu chegar àquela final- e que agora diz não ser culpado de o abominável senhor Nieves, o árbitro uruguaio que operou a Bolívia, não ter, por exemplo, expulsado o mesmo Edmundo, o pugilista que não morde nem assopra, soca?
Mas quem falou que ele tem culpa?!
Não seria mais decente reconhecer o óbvio, que árbitros atrapalham e ajudam o Brasil, mais ajudam que atrapalham? Ou Edmundo também não estava clamorosamente impedido no primeiro gol?
Não é assim que deve agir um patriota menos "esperto"?



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice



Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita do Universo Online ou do detentor do copyright.