São Paulo, sexta-feira, 02 de fevereiro de 2007

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XICO SÁ

Pedro Paulo Soares Pereira Santos

Mano Brown é torcedor que não permite gracejo com seu amor, preto-e-branco, o qual quer ver reinar na sua área

AMIGO TORCEDOR , amigo secador, conheço muitos chapas com uma devoção aos seus times, Marko é tricolor ao infinito, para ele o mundo é branco, vermelho e preto, Marcelo, de Santo André, é mais verde que o Incrível Hulk, Marivaldo, lá em Taipas, mata e morre pelo Corinthians, um mosqueteiro que vale por mil doentes.
No Rio, Jorge Ben é Flamengo, a quem ama muito mais que a própria nega, Teresa, lembra?, Paulinho da Viola é Vasco, assim como Chico é das Laranjeiras, os Joões, sejam Sales ou sejam Silvas, são como o João Máximo, todos Botafogo.
Lamartine Babo, bem, é um caso à parte, o cara fez os hinos do Fla, do Flu, da Cruz de Malta e da Estrela Solitária, mas repare bem, veja como a música, ao contrário do futebol, tem sua lógica, foi o hino do América que mereceu mais capricho, "hei de torcer, torcer, torcer, hei de torcer até morrer, morrer, morrer... pois a torcida americana é mesmo assim, a começar por mim...". Cartola? Ah, Cartola, como mostra o documentário de Hilton Lacerda e Lírio Ferreira, era mais de dona Zica e da Mangueira do que qualquer clube, pois no amor e no samba a regra é preta e linda como o amor a uma mulher ou a uma escola.
Capiba era Náutico, como mestre Canibal, do punk-rock hardcore lá do Alto Zé do Pinho. Já o Faces do Subúrbio é dividido, tem de tudo, se brincar tem até torcedor do Íbis. Luiz Gonzaga não ligava muito, mas tinha queda pelo Icasa de Juazeiro, ali na vizinhança da chapada. Chico Science, salve, era Santa, como a maioria das bandas de Olinda... Ou era Sport, como Zero Quatro e família? Outro, me lembro, que não era muito chegado, se fosse fanático, essa dúvida eu não teria, era do groove, do James Brown Futebol Clube, com quem bate a sua bola honesta na meia-lua do salão do baile black.
De torcedor doente ou de secador maluco, todo mundo tem um pouco. Anônimo ou famoso, a febre de bola é inevitável, vai além da camada de ozônio, além de termômetros no suvaco, muito além do aquecimento do planeta, o jogo é jogado, o resto é lenda. Mas amor à camisa mesmo, amor em preto-e-branco, com o amarelo das antigas e o blues das dores portuárias, amor à camisa sem limite, de verdade verdadeira, é o amor de Mano Brown pelo Santos.
Pouco amor não é amor, como dizia o velho Nelson, na boa, confesso, nunca vi amar um clube com tanto zelo. Não permite que se fale nada negativo, nem de brinquedo, não estou falando de torcedor de sofá, o santista é da arquibancada, do cimento. E uma de suas missões é dizer a todo mundo o quanto o Santos é grande. Já disse isso para atletas, técnicos. E me disse isso, na lata, de corpo presente, no nosso encontro entre quatro santistas, para não deixar quicar a bola de qualquer dúvida.
Onde estiver, Brown estará lembrando: o Santos é o maior de todos. E deixo aí um tira-teima para o debate entre Kfouri e Torero: Mano Brown prefere que o Peixe enfileire vários certames paulistas em vez da obsessão megalô da Libertadores, rubrico embaixo, três vias, carimbo. Você tem que ser grande na sua área, ser respeitado no seu terreiro, ainda mais para um time que ganhou tudo, no tempo em que o Mundial era o que era, Mundial mesmo, nada de Copa Toyota, sem ranking fajuto.
Brown, passional e racional, quer o Santos jogando mais em São Paulo, no tamanho da metrópole, milhões de habitantes, multiplicação dos pães e da espécie, sabe como é, filho de peixe peixinho é. É bíblico. Como nas invasões das antigas, em que os alvinegros faziam filas de conquistas no Morumba, sem essa de ceder o mando ao Parque Antarctica, como no clássico de domingo. Agora um rápido verso sampleado: Santos, sempre Santos, demoro, já é, como é grande, o meu amor... (pausa) por você!

xico.folha@uol.com.br


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