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Pequim teme falta de tempo para mudar de fato
A 5 meses da Olimpíada, população ainda mantém velhos hábitos, e medidas contra poluição devem ser só paliativas
Governo determina até paralisação de obras para evitar o pó das construções e esvaziar a cidade, que ganha mil novos carros por dia
RAUL JUSTE LORES
DE PEQUIM
Mais de US$ 40 bilhões gastos em infra-estrutura e prédios espetaculares de alguns
dos melhores arquitetos do
mundo não foram capazes de
deixar Pequim nos trinques para os Jogos Olímpicos.
A cinco meses do maior
evento internacional que o país
já promoveu, demonstração da
China como nova potência
mundial, há sinais de insegurança por todos os lados.
Há diversos planos mirabolantes em andamento para deixar a capital mais limpa, menos
poluída e para educar seus cidadãos, famosos por furarem
toda e qualquer fila, além de escarrarem sonoramente pelas
calçadas. As mudanças serão à
força, como é do feitio do governo comunista, no poder desde
1949. O tempo é curto.
A reportagem da Folha conversou com urbanistas e membros da administração municipal. Sob o anonimato imposto
pelo Partido Comunista, eles
admitem que há apreensão variada, desde o pequeno número
de taxistas que sabe falar inglês
ou entender palavras que não
estejam escritas nos ideogramas chineses, até a poluição.
O governo determinou a paralisação dos estimados 3.000
canteiros de obras da cidade
entre julho e setembro. Não só
para evitar o pó das construções, mas para esvaziar a cidade -há 5 milhões de migrantes
do interior na capital, principalmente na construção civil,
que devem voltar para suas
províncias por um bom tempo.
Segundo os urbanistas, as
campanhas para reduzir a poluição têm efeito limitado.
Apesar do deslocamento de
cem fábricas do centro para a
periferia da capital, e a substituição de 4.000 velhos ônibus e
30 mil táxis quase sucateados,
a frota não pára de crescer.
O trânsito de Pequim ganha
mil carros novos por dia, graças
ao frenesi consumista do país
onde a propriedade privada de
um automóvel para uso pessoal
só foi liberada em 2001. Em janeiro, 20 dias foram considerados "seriamente poluídos",
pior cifra em seis anos.
A prefeitura ainda estuda
uma campanha com punições e
multas que pretende retirar
mais de um milhão de carros
das ruas de Pequim nos 15 dias
dos Jogos. Uma espécie de rodízio em que todos deixarão os
carros na garagem, sem importar o número final da placa.
Em 2007, estudo da Agência
Espacial Européia concluiu
que Pequim e as províncias vizinhas tinham então o pior nível de dióxido de nitrogênio no
mundo, que pode causar danos
fatais aos pulmões. Atletas de
provas de longo fôlego, como a
maratona, já reclamam publicamente da poluição da cidade.
O governo também promete
acabar com outra fumaceira
onipresente, a do cigarro. A
partir de maio ou junho, vai ser
proibido fumar em qualquer
lugar fechado. Algo comum em
capitais desenvolvidas, mas incomum em Pequim, onde não
existem áreas separadas para
não-fumantes na maioria dos
restaurantes da cidade.
Pesquisas apontam que seis
entre cada dez homens adultos
fumam regularmente. Um terço dos fumantes do mundo é de
chineses (350 milhões).
O tempo curto para tantas
transformações gera dúvidas.
O taxista Cao Shiliang, há oito
anos na praça, diz que as medidas são boas, mas acha que é
impossível tanta mudança em
cinco meses. "Já não fumo dentro do táxi, como sempre fiz,
mas tem outras coisas que é
mais difícil mudar. Sou velho."
Nas nuvens
Na cruzada para transformar
hábitos e o ar da capital, a China quer também tentar domar
a natureza. Para evitar chuvas
bastante comuns no verão, o
governo disponibilizou cinco
aviões e artilharia antiaérea para bombardear nuvens.
O hidrogênio liberado provocará as chuvas antes que elas
cheguem a Pequim.
Depois de sete anos de preparativos bilionários e crescimento econômico de 11% ao ano, o
que a tornou a terceira maior
economia do mundo, a China
não quer permitir que algumas
nuvens estraguem a sua festa.
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