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MOTOR
O fusca
JOSÉ HENRIQUE MARIANTE
EDITOR-ADJUNTO DE ESPORTE
Um grupo de crianças. Bicicletas largadas na calçada, preteridas por uma partida de taco,
provavelmente mais espetacular
que final de Copa. De repente, o
fusca, imaculadamente branco,
novo em folha, virou a esquina.
Passou devagar, em respeito ao
jogo, às latas. Reconheci meu pai
ao volante, gritei e saí correndo.
A turma veio junto. Perseguimos o carro como vira-latas. Não
havia nada no fusca que denunciasse a novidade, apenas o cheiro. Estacionado, alguém finalmente observou: "Olha, sai uma
agüinha do escapamento". A novidade do dia, da semana, do ano
era um prosaico carro a álcool.
Novidade porque não existia.
Meses antes, era apenas mais
uma das sandices do governo, dividido entre o milagre econômico
e a brutal crise mundial do petróleo. Literalmente a toque de caixa, o país fora atrás das chamadas fontes alternativas, e o álcool
de cana virou combustível, marco
da tecnologia nacional. O Brasil
dava certo, mesmo que fosse necessário esquentar o motor.
Meu pai trabalhava em uma
montadora no ABC, pegara o carro para testar. Passamos quatro
dias com o fusca, um feriado, sem
ter onde abastecer e obrigados a
explicar, em todos os lugares, o
afogador, a agüinha, a corrosão.
Nunca vou esquecer isso, assim
como nunca vou esquecer que cada jogo da Copa começava com o
infalível "imagens via Embratel".
Nunca me esquecerei do sesquicentenário da Independência e do
cavalo de um dos dragões que fez
o maior cocô que já tinha visto.
Nesse universo paralelo, onde se
ignorava porões, tortura ou ditadura, uma das maiores atrações
foi seguramente o Copersucar, o
primeiro carro da equipe de F-1
montada pelos irmãos Fittipaldi.
A idéia já parecia absurda naquele tempo, mas vingou, com a
ajuda da então estatal Embraer e
da empresa que vaticinou um futuro internacional para o álcool.
O carro teve um começo difícil,
mas decolou aos trancos e barrancos depois que Emerson abandonou sua carreira de bicampeão
e contratos milionários -uma
porrada na F-1 da época. O ápice
foi o GP Brasil de 1978, no Rio,
quando chegou em segundo lugar. Foi algo como a primeira vitória de Senna em Interlagos.
A equipe ruiu logo no começo
dos 80, por falta de patrocínio e,
para muitos, competência administrativa. Nesta semana, ao
anunciar a restauração do pioneiro FD-01, Wilson Fittipaldi
afirmou que o país "não entendeu" a grande aventura e que ela
deu certo pelo menos enquanto
durou. É mais fácil acreditar que
os Fittipaldi surfaram nos vagalhões do progresso fabricado pelos
militares e que um belo dia a
brincadeira acabou. Não apenas
a deles, mas a de um país.
Acordei um pouco antes. Naquele mesmo 78, durante outro
jogo, outra emocionante final de
Copa, na verdade uma rápida
partida de futebol no curto recreio do colégio. Chutei ao gol, e a
bola entrou com enorme facilidade. O goleiro olhava para o céu.
De um verde helicóptero, soldados apontavam metralhadoras.
Não para nós, mas para a igreja
ao lado. Tinha um barbudo lá fazendo greve. Descobri o Brasil.
Senna
Está explicado o medo da F-1 com as regras do direito comunitário
na Europa, aquelas que fizeram Max Mosley se mudar para Mônaco.
Antes, Frank Williams poderia deixar de pisar na Itália para evitar
transtornos com a Justiça local. Agora, não escapa nem em casa.
McLaren
Na terceira corrida do ano, Raikkonen, a primeira vítima do motor
longa vida, joga a toalha. E o time de Ron Dennis desce a ladeira.
Zonta
Em pista nova, piloto reserva na pista. Para escolher os pneus, a Toyota colocou Ricardo Zonta para rodar nada menos que 48 voltas ontem. Acabou sendo mais rápido que os titulares Da Matta e Panis.
E-mail mariante@uol.com.br
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