São Paulo, sábado, 03 de abril de 2004

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FUTEBOL

A classe operária vai ao paraíso?

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

Dada a instabilidade atual do Cruzeiro, o Santos é, a meu ver, o melhor time do Brasil no momento. Mas isso não significa que ele seja favorito para vencer hoje o São Caetano e chegar à final paulista.
Primeiro, porque no futebol as coisas não se passam de modo tão simples. Nem sempre é a melhor equipe que vence. Segundo, porque o São Caetano está longe de ser um adversário fácil, como ficou comprovado no primeiro jogo entre os dois, domingo passado.
O São Caetano, na verdade, é quase um mistério. Embora não tenha ganhado nenhum título importante, é talvez o clube brasileiro que se manteve com mais regularidade nas primeiras colocações dos torneios dos últimos quatro anos. Pode conferir: dos quatro Brasileiros que disputou, o Azulão foi vice duas vezes, ficou uma vez em quarto e uma em sexto. À parte isso, foi vice da Libertadores em 2002.
Que outro clube nacional teve uma performance tão boa em tão pouco tempo? Nunca é demais lembrar que o São Caetano só tem 14 anos de vida. O Santos, seu adversário hoje, está fazendo 92.
Nos quase cinco anos que se passaram desde que o Azulão ganhou visibilidade nacional, ao subir meteoricamente rumo à final do Brasileirão de 2000, a equipe mudou de elenco e de técnico várias vezes. Do time que chegou àquela decisão, só restam hoje Silvio Luiz, Dininho e Serginho.
Mesmo assim, é possível detectar a permanência, se não de um padrão de jogo, ao menos de um espírito, ou melhor, de um caráter. Pois com qualquer treinador (Jair Picerni, Mário Sérgio, Tite ou Muricy) o São Caetano foi sempre aguerrido e solidário, com jogadores capazes de exercer várias funções em benefício do coletivo. Por isso, costuma-se dizer que o Azulão é "time operário".
Talvez seja pela origem geográfica, o ABC paulista, berço da indústria metalúrgica e do moderno sindicalismo brasileiro. Talvez seja o azul do uniforme, que lembra o dos macacões dos trabalhadores fabris.
O fato é que o São Caetano em campo sempre dá a impressão de solidez, potência e confiabilidade de uma linha de produção.
Mas não uma produção automatizada e impessoal como a que vemos em "Tempos Modernos", de Chaplin, ou em "Metrópolis", de Fritz Lang.
A produção do São Caetano comporta a nostalgia do artesanato e da manufatura. Traz a marca indelével do humano, da sagrada transformação da matéria pelo trabalho. Nessa curta história sem grandes mitos ou heróis, adquire uma tonalidade de parábola bíblica o episódio do lateral-esquerdo César (hoje na Europa), reabilitado pelo futebol no São Caetano depois de ter cumprido pena de prisão por assalto.
O poder regenerador do trabalho e da ação coletiva. Hoje em dia, quando a classe operária parece minguar, por conta do desemprego e do esvaziamento da política, é essa bela idéia que o São Caetano nos traz de volta. Mesmo que, mais uma vez, seja barrado na porta do paraíso.

Futebol zero
O jogo da seleção contra o Paraguai foi ruim porque o "trio de ouro" (Kaká e os Ronaldos) não se entrosou e porque os três ficaram isolados do restante da equipe. Parece que Parreira somente sabe montar esquemas defensivos. As ações ofensivas ele deixa por conta do improviso dos craques. Gol (seja a favor ou contra) parece ser uma coisa à qual o técnico da seleção brasileira tem horror.

Talento instável
Se conseguir domar o temperamento turbulento de Piá, Oswaldo Oliveira poderá montar um meio-campo com um mínimo de qualidade e talento no Corinthians, algo que não ocorre desde a saída de Ricardinho -que hoje em dia esquenta o banco do medíocre Middlesbrough, na Inglaterra.

E-mail jgcouto@uol.com.br


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