São Paulo, sexta-feira, 03 de maio de 2002

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FUTEBOL

Torneios entre times operários, apesar de mais antigos, são ignorados

Paulistas comemoram hoje cem anos de futebol de rico

Mauricio Piffer/Folha Imagem
Réplica de camisa do Mackenzie de 1902, apito da época e livro da Fifa sobre as origens do futebol


DA REPORTAGEM LOCAL

Se foi um jogo da elite, será uma festa para a elite. O futebol de São Paulo comemora hoje, às 19h, o centésimo aniversário da primeira partida oficial do Paulista com um evento fechado ao público.
Patrocinado pela FPF, ele será realizado no Pacaembu, estádio em que se tentará recriar o ambiente daquela que foi considerada a primeira partida oficial de futebol do Brasil: Sport Club Germânia x Mackenzie College, disputada em 3 de maio de 1902.
De acordo com a Federação Paulista de Futebol, estarão presentes não mais do que 600 convidados vips, pois seria difícil organizar ""uma partida de época" com portões abertos à torcida.
No início do século passado, quando foi fundada a Liga Paulista de Foot-ball, primeira entidade do gênero no país, dela só faziam parte ""times com pedigree".
Os fundadores -São Paulo Athletic Club, A.A. Mackenzie, S.C. Internacional, S.C. Germânia e C.A. Paulistano- participaram do primeiro campeonato oficial do Estado. Mackenzie e Germânia, do primeiro jogo. Fundado em 18 de agosto de 1898, o Mackenzie, primeiro time da elite formado por jovens brasileiros, acabou vencendo por 2 a 1.
Antes da partida, ""as distintas famílias deram vivas aos dois times", como relataram jornais da época, já que uma placa no Parque da Antarctica Paulista, campo onde o jogo foi realizado, proibia vaia da torcida aos jogadores.
Em seguida, os ""captains", como eram conhecidos os capitães das equipes, trocaram flâmulas e o confronto teve início. No final, o vencedor levantou uma taça com champanhe, oferecida a todos os atletas, e uma coroa de flores.
Os times populares, por sua vez, compostos por operários, negros e estudantes de bairros mais pobres, como Belenzinho e Barra Funda, não tiveram acesso ao primeiro Campeonato Paulista.
Por isso, apesar de terem disputado torneios antes mesmo de 1902, não serão lembrados no evento de hoje. É o caso do União Futebol Clube, um dos times de negros e mulatos considerados do ""baixo clero", que disputou competições consideradas de menor importância, mais tarde conhecidas como ""varzeanas", que não tiveram seus jogos oficializados.
José Jorge Farah Neto, um dos idealizadores do evento comemorativo no Pacaembu, reconhece que São Paulo teve outros torneios antes de 1902, entre os quais competições de futebol entre ferroviários da Companhia Paulista e da São Paulo Railway, no início da década anterior.
""Mas o futebol ganhou espaço mesmo quando se tornou um esporte da elite e só foi reconhecido, em termos oficiais, quando referendado por uma liga", explicou Farah Neto, que é pesquisador do futebol paulista e filho de Eduardo José Farah, presidente da FPF.
""Havia o futebol praticado pelos mais abastados, digamos assim, e o jogado na periferia. Não era como hoje, onde tudo se misturou."
José Moraes dos Santos Neto, que pesquisou as origens do futebol paulista, concorda com ele. ""Havia o grande futebol, das elites, e o pequeno, dos times de várzea". ""Uns eram os dignos representantes do nobre esporte bretão, e os outros não estavam à altura do reconhecimento oficial e da igualdade na forma de tratamento", constatou.
Com o passar dos anos e o crescimento dos times ditos populares -ou de várzea-, a Liga Paulista começou a sofrer um baque.
Arquivos do Germânia, que depois se transformaria no E.C. Pinheiros, do Paulistano e da própria FPF mostram a repercussão negativa entre a elite da entrada do Ipiranga F.C., oriundo da várzea, entre o ""alto clero". O Paulistano decide sair da Liga, o São Paulo Athletic Club encerra suas atividades e, em 1913, as equipes tradicionais fundam a Associação Paulista de Esportes Atléticos. (JOÃO CARLOS ASSUMPÇÃO)



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