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Seleção dá força a Mugabe
Há 30 anos no poder, ditador
usa amistoso como palco
político ao lotar estádio
com quase 60 mil simpatizantes
e descer ao gramado para cumprimentar Kaká
Andre Penner/Associated Press
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O atacante Robinho comemora seu gol, o segundo brasileiro no jogo de ontem
Zimbábue 0
Brasil 3
Michel Bastos, aos 41min, e
Robinho, aos 44min do 1º tempo;
Elano, aos 11min do 2º tempo
FÁBIO ZANINI
PAULO COBOS
MARTÍN FERNANDEZ
ENVIADOS ESPECIAIS A HARARE (ZIMBÁBUE)
O resultado, uma vitória
por 3 a 0, logo será esquecido. Mas o "abraço" em um
dos mais sanguinários ditadores africanos vai ficar na
história da seleção brasileira.
Em Harare, a capital, o time de Dunga fez a festa para
Robert Mugabe, 86, que com
mão de ferro preside o Zimbábue há 30 anos.
O amistoso, o primeiro na
reta final de preparação para
a Copa da África, deu ares de
legitimidade para um regime
enfraquecido tanto internamente quanto no exterior.
Com a parte nobre do estádio lotada por simpatizantes,
e com ponto facultativo dado
aos funcionários públicos (os
maiores candidatos a comprar os ingressos mais baratos, a US$ 10), Mugabe foi
ovacionado quando entrou
em campo, com uma bandeirinha do Zimbábue em mãos,
antes de a bola rolar.
Ao lado da mulher, Grace,
percorreu um quarto da pista
de atletismo vibrando e acenando para os torcedores.
Ofuscou nesse momento o
primeiro-ministro, Morgan
Tsvangirai, seu maior opositor, com quem hoje forma
uma frágil coalizão. Tsvangirai entrou no gramado de forma mais discreta, descendo
da tribuna de honra.
Houve ontem ecos da excursão do Santos de Pelé em
1967, que parou uma guerra
na Nigéria. No Zimbábue, a
seleção deu ao país um raro
momento de trégua política
entre dois personagens que
dividem o Executivo mas se
sabotam mutuamente.
Coadjuvante na festa de
Mugabe, restou a Tsvangirai
postar-se ao lado do ditador e
até trocar algumas palavras
com ele. À Folha durante o
intervalo, o primeiro-ministro contemporizou: "É um
dia de festa para o país. Não
vamos tratar de política".
A seleção ainda associou a
imagem de alguns jogadores
mais famosos do mundo ao
ditador. Mugabe entrou em
campo e cumprimentou os titulares de Dunga, incluindo
Kaká, único mais aplaudido
que ele pelos quase 60 mil
torcedores na arena.
Remodelado com dinheiro
chinês, o Estádio Nacional
exibiu o desfile do presidente
em um moderno telão.
Antes, Mugabe pressionou, sem sucesso, para levar
Dunga e seus atletas a um encontro na sede do governo.
Ao site da CBF Dunga disse
que "foi bonito ver as pessoas tão felizes nas ruas e no
estádio". "Isso é prova de
quanto a seleção é querida e
respeitada no mundo."
Na tribuna de honra, Mugabe e Tsvangirai sentaram-
-se separados por um ministro. De óculos escuros, o presidente assistiu ao jogo afundado numa poltrona.
Mesmo com uma relativa
abertura política que a coalizão trouxe ao país, a repressão comandada por Mugabe
continua. Em recente relatório, a ONG Human Rights
Watch afirmou que "no último ano, 15 jornalistas foram
ameaçados, detidos arbitrariamente ou agredidos pelas
forças de segurança".
A seleção faz ainda outro
amistoso antes da estreia na
Copa, no dia 15 de junho. Na
segunda, uma outra viagem
pela África, mas para a Tanzânia, uma democracia.
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