|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"Futebol é varonil, não homossexual"
Juiz rejeita queixa-crime de Richarlyson e escreve que "esta situação, incomum, do mundo moderno, precisa ser rebatida"
Sentença é considerada "homofóbica" por advogado do jogador, que recorre e pede processo disciplinar contra o magistrado no CNJ
MARIANA BASTOS
RICARDO PERRONE
DA REPORTAGEM LOCAL
Depois de gerar polêmica no
futebol, o episódio que envolve
o são-paulino Richarlyson e o
diretor administrativo do Palmeiras, José Cyrillo Jr., ganhou
contornos mais agudos na Justiça. A queixa-crime apresentada pelo volante contra o cartola
foi arquivada pelo juiz Manoel
Maximiano Junqueira Filho,
que, em sua sentença, classifica
o futebol de "jogo viril, varonil,
não homossexual".
O jogador foi à Justiça após o
dirigente citar o seu nome ao
responder uma pergunta sobre
homossexualismo no futebol
em programa da TV Record.
A Folha teve acesso ao despacho de quatro páginas no
qual o magistrado relaciona os
motivos para o arquivamento,
no último dia 5 de julho.
No documento, o juiz sugere
que, se [o atleta] fosse homossexual, "melhor seria que abandonasse os gramados".
Em outro trecho, Junqueira
Filho diz que "quem se recorda
da Copa do Mundo de 1970,
quem viu o escrete de ouro jogando (...) jamais conceberia
um ídolo ser homossexual".
A seguir, ele afirma: "Não
que um homossexual não possa jogar bola. Pois que jogue,
querendo. Mas forme seu time
e inicie uma Federação".
Por fim, Junqueira Filho utiliza uma estrofe popular antes
de proferir a sentença: "Cada
um na sua área, cada macaco
no seu galho, cada galo em seu
terreiro, cada rei em seu baralho. É assim que penso".
Renato Salge Prata, um dos
advogados de Richarlyson no
caso, já entrou com uma apelação contra a decisão do juiz. Ele
também encaminhou reclamação contra Junqueira Filho ao
Conselho Nacional de Justiça.
Alegou homofobia por parte do
juiz e espera que ele responda a
processo disciplinar.
O advogado também pediu
para que, se o caso for reaberto,
não retorne ao mesmo juiz.
"Foi uma decisão esdrúxula e
homofóbica. Ele confundiu juiz
de direito com árbitro de futebol", afirmou Prata.
Richarlyson assinou a apelação, mas seus advogados não
lhe mostraram a sentença.
Avaliam que seu conteúdo poderia perturbar o jogador. "É
um assunto que precisa ser
conversado com tempo."
Cyrillo Jr. disse que não sabia da decisão. "Uns dois dias
depois, fui ao mesmo programa
de TV e me retratei, dei minhas
explicações, nunca o chamei de
homossexual. Então, não há
motivo para um tête-à-tête",
disse o cartola.
A Folha tentou entrar em
contato com o juiz logo após ter
acesso ao documento às 18h30
de ontem, mas o fórum dispensou todos mais cedo devido à
greve do metrô em SP. Ainda
tentou contato por intermédio
de familiares, mas não conseguiu. A assessoria do TJ também não atendeu as ligações.
A polêmica que envolve Richarlyson teve início no final
de junho. Indagado no programa "Debate Bola", da Record,
sobre a possibilidade de haver
um atleta homossexual no
elenco palmeirense disposto a
assumir publicamente sua condição, Cyrillo começou a responder dizendo: "O Richarlyson quase foi do Palmeiras".
A pergunta surgiu dias após a
coluna Zapping, do jornal
"Agora", informar, sem citar
nomes, que um atleta de um
grande clube paulista estaria
negociando com a Globo para
assumir a homossexualidade.
Após as declaração de Cyrillo
Jr., os advogados entraram
com uma queixa-crime contra
ele com base no artigo 22 da
Lei de Imprensa, que trata de
injúria por meio da mídia. A
pena prevista é de detenção, de
um mês a um ano, ou multa de
até dez salários mínimos.
Texto Anterior: Fábio Seixas: Está nas mãos dos pilotos Próximo Texto: Após susto, São Paulo vira e continua ao lado do líder Índice
|