São Paulo, sexta-feira, 03 de agosto de 2007

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"Futebol é varonil, não homossexual"

Juiz rejeita queixa-crime de Richarlyson e escreve que "esta situação, incomum, do mundo moderno, precisa ser rebatida"

Sentença é considerada "homofóbica" por advogado do jogador, que recorre e pede processo disciplinar contra o magistrado no CNJ

MARIANA BASTOS
RICARDO PERRONE
DA REPORTAGEM LOCAL

Depois de gerar polêmica no futebol, o episódio que envolve o são-paulino Richarlyson e o diretor administrativo do Palmeiras, José Cyrillo Jr., ganhou contornos mais agudos na Justiça. A queixa-crime apresentada pelo volante contra o cartola foi arquivada pelo juiz Manoel Maximiano Junqueira Filho, que, em sua sentença, classifica o futebol de "jogo viril, varonil, não homossexual".
O jogador foi à Justiça após o dirigente citar o seu nome ao responder uma pergunta sobre homossexualismo no futebol em programa da TV Record.
A Folha teve acesso ao despacho de quatro páginas no qual o magistrado relaciona os motivos para o arquivamento, no último dia 5 de julho.
No documento, o juiz sugere que, se [o atleta] fosse homossexual, "melhor seria que abandonasse os gramados".
Em outro trecho, Junqueira Filho diz que "quem se recorda da Copa do Mundo de 1970, quem viu o escrete de ouro jogando (...) jamais conceberia um ídolo ser homossexual".
A seguir, ele afirma: "Não que um homossexual não possa jogar bola. Pois que jogue, querendo. Mas forme seu time e inicie uma Federação".
Por fim, Junqueira Filho utiliza uma estrofe popular antes de proferir a sentença: "Cada um na sua área, cada macaco no seu galho, cada galo em seu terreiro, cada rei em seu baralho. É assim que penso".
Renato Salge Prata, um dos advogados de Richarlyson no caso, já entrou com uma apelação contra a decisão do juiz. Ele também encaminhou reclamação contra Junqueira Filho ao Conselho Nacional de Justiça. Alegou homofobia por parte do juiz e espera que ele responda a processo disciplinar.
O advogado também pediu para que, se o caso for reaberto, não retorne ao mesmo juiz.
"Foi uma decisão esdrúxula e homofóbica. Ele confundiu juiz de direito com árbitro de futebol", afirmou Prata.
Richarlyson assinou a apelação, mas seus advogados não lhe mostraram a sentença. Avaliam que seu conteúdo poderia perturbar o jogador. "É um assunto que precisa ser conversado com tempo."
Cyrillo Jr. disse que não sabia da decisão. "Uns dois dias depois, fui ao mesmo programa de TV e me retratei, dei minhas explicações, nunca o chamei de homossexual. Então, não há motivo para um tête-à-tête", disse o cartola.
A Folha tentou entrar em contato com o juiz logo após ter acesso ao documento às 18h30 de ontem, mas o fórum dispensou todos mais cedo devido à greve do metrô em SP. Ainda tentou contato por intermédio de familiares, mas não conseguiu. A assessoria do TJ também não atendeu as ligações.
A polêmica que envolve Richarlyson teve início no final de junho. Indagado no programa "Debate Bola", da Record, sobre a possibilidade de haver um atleta homossexual no elenco palmeirense disposto a assumir publicamente sua condição, Cyrillo começou a responder dizendo: "O Richarlyson quase foi do Palmeiras".
A pergunta surgiu dias após a coluna Zapping, do jornal "Agora", informar, sem citar nomes, que um atleta de um grande clube paulista estaria negociando com a Globo para assumir a homossexualidade.
Após as declaração de Cyrillo Jr., os advogados entraram com uma queixa-crime contra ele com base no artigo 22 da Lei de Imprensa, que trata de injúria por meio da mídia. A pena prevista é de detenção, de um mês a um ano, ou multa de até dez salários mínimos.


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