São Paulo, domingo, 03 de agosto de 2008

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Treinadora é raridade no Brasil

Comissões técnicas têm só 11 mulheres nas 32 modalidades em que o país competirá na Olimpíada

Participação pequena no comando contrasta com o percentual feminino entre os atletas da delegação, que chega a 47,3% neste ano

Fotos Satiro Sodré/CBDA/Divulgação
Kaio Márcio, que é treinado por Rosane Carneiro, nada borboleta em Macau, onde a seleção de natação faz sua aclimatação para os Jogos Olímpicos de Pequim

MARIANA LAJOLO
ENVIADA ESPECIAL A MACAU

Rosane Carneiro já soma mais de 20 anos dedicados à natação. Revelou jovens talentos, levou-os à seleção, amealhou títulos, enfrentou preconceito, mas ainda faltava uma marca em seu currículo.
Já quase desistira do esporte quando Kaio Márcio reapareceu. Com status de recordista mundial, seu ex-nadador do juvenil fez o convite: ele a queria de novo na borda da piscina.
Rosane relutou, mas refez a parceria. E, poucos meses depois, tornava-se a primeira técnica a ocupar vaga na comissão de uma seleção adulta. Agora, repete o feito em Pequim.
Mulheres na prancheta não são raridade apenas na elite da natação. E a delegação que vai à China expõe esse abismo.
Apenas 11 mulheres aparecem nas comissões técnicas e 5 como chefes de equipe nas 32 modalidades em que o Brasil terá representantes na China. Duas delas estão em esportes apenas femininos.
A participação é discreta, sobretudo se comparada à evolução das mulheres no número de atletas da delegação. As brasileiras são 47,3% do grupo que vai à China. São 132 mulheres, 8,2% a mais do que em Atenas-2004, quando 122 viajaram.
"Infelizmente, ainda há machismo. Por mais que você faça um bom trabalho, tenha atletas de destaque, ainda vão olhá-la diferente porque você é mulher", diz Rosane, que está com a seleção de natação em Macau.
"O Brasil ainda precisa quebrar esse tabu. Há muitas técnicas nas categorias de base da natação, mas não nas equipes principais", completa.
Rosicléia Campos até pouco tempo atrás dividia o tatame com as judocas. Em 2004, teve a chance de assumir a equipe -o treinador não poderia viajar com a seleção. No ano seguinte, foi escolhida para o cargo.
"Existem coisas que só mulher entende porque já vivenciou, como os problemas para perder peso, retenção de líquido, cólica menstrual. Elas gostaram dessa convivência", diz.
À época, ainda a confundiam com uma atleta. "Isso me incomodava", afirma Rosicléia.
Para ajudar no desenvolvimento das judocas, a técnica decidiu tentar propor algumas mudanças na estrutura da equipe, como tirar as mulheres da sombra do time masculino.
Mudanças feitas, nos Jogos Pan-Americanos do Rio, em 2007, as brasileiras conquistaram dois ouros e quatro pratas.
Algumas treinadoras nacionais não vão aos Jogos à frente de suas equipes. Mas serão peças-chave no banco de reservas como auxiliares técnicas.
Oleg Ostapenko, guru ucraniano da ginástica nacional, divide as responsabilidades na seleção com sua mulher, Nadia Ostapenko, e Irina Ilyaschenko. Marisa Loffredo e Rita Orsi ajudam o espanhol Juan Oliver Coronado a comandar a seleção feminina de handebol.
Nas modalidades exclusivamente femininas, como ginástica rítmica e nado sincronizado, a predominância de mulheres no comando é total. O nado, por exemplo, tem uma chefe de equipe, Mônica Rosas, e duas técnicas, Roberta Perillier e Magali Cremona. Na grande maioria das modalidades, porém, esse cenário é distante.
"As pessoas se espantam quando vêem o Kaio treinando comigo, e não quando vêem o técnico do basquete comandando a seleção feminina. O Kaio sabe que sou mulher, isso não importa. O que importa são minhas atitudes, que são de profissional", diz Rosane.


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