|
Texto Anterior | Índice
FUTEBOL
Quem inventa é o craque
TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA
Segundo o Aurélio, pragmatismo significa que a verdade
de uma proposição consiste no fato de que ela seja útil, tenha alguma espécie de êxito ou satisfação.
No esporte, todos os times e atletas, em todas as épocas, são mais
ou menos pragmáticos, porque,
independentemente do estilo e da
qualidade, competem para vencer. Alguns também dão espetáculo. Esses são os melhores.
A beleza do futebol não está
apenas nos dribles e nas belíssimas jogadas individuais. É bonito
também ver um conjunto afinado, se movimentando como a coreografia de um balé ou de uma
escola de samba. Os jogadores
(passistas) aceleram e desaceleram, sem perder a harmonia, de
acordo com o momento do jogo.
A pouca variação de ritmo é
uma deficiência dos times dirigidos pelo Parreira. O coração de
suas equipes bate sempre com a
mesma frequência, com pouca
emoção.
Para se formar um excelente time, além de ótimos jogadores, é
preciso definir uma maneira de
jogar (a estratégia vai muito além
do desenho tático), criar algumas
variações, treinar os mínimos detalhes e escalar os atletas nas funções e posições corretas. Nada disso funciona sem muita transpiração. "O que ganha e perde jogos é
a alma." (Nelson Rodrigues)
Luxemburgo planejou todos os
detalhes na formação da equipe
do Cruzeiro. Ele evoluiu como
treinador. No time mineiro, não
inventou nem criou supostas novidades para ser valorizado. A sobriedade mineira lhe fez bem.
Técnico não inventa. Quem inventa é o craque, no campo.
Com raras exceções, não é o craque que faz um time atuar bem. É
uma equipe organizada que faz o
craque se destacar mais do que os
outros. Quanto mais craques melhor, desde que atuem em posições e funções diferentes. Quando
há mais de um craque na mesma
posição, um tem de se adaptar a
outra função. Poucos conseguem.
Pelas suas características, Alex
não brilharia numa posição diferente da habitual.
Luxemburgo colocou o Alex livre, nas costas dos volantes e próximo dos dois atacantes, sem a
obrigação de recuar e marcar. No
Flamengo, ele jogava na mesma
posição do Petkovic. Os dois têm
características bastante parecidas. Um ocupava o espaço do outro. Não poderia dar certo. O time
era também muito bagunçado.
Citam muito a seleção de 70 como exemplo de que todos os craque têm sempre de jogar, independentemente da posição. Rivellino e Gérson, que jogavam nos
seus clubes na mesma posição, tiveram funções diferentes. Um
completava o outro. Rivellino era
mais habilidoso, driblador e finalizador. Gérson era mais organizador e cerebral.
Na mesma Copa, atuei numa
posição diferente, de centroavante. Só deu certo porque a seleção
precisava, ao lado de dois jogadores velozes, agressivos e artilheiros
(Pelé e Jairzinho), de um jogador
técnico, de toques curtos e de bom
passe. Não fui o meia-armador
que era no Cruzeiro nem um típico centroavante. Fui um centroavante armador.
No Cruzeiro, Zinho é o substituto do Wendell, na função de terceiro volante pela esquerda, defendendo e atacando. Se Zinho jogasse com o Alex da mesma forma que atuou contra o Paysandu,
um atrapalharia o outro.
Nessa partida, diferentemente
dos outros jogos em que entrou no
lugar do Alex, Zinho foi tão bom
quanto o craque do time. Num jogo especial, o craque teria de ser
um atleta especial, símbolo de
profissionalismo, eficiência e solidariedade em campo.
Alex brilhou durante todo o torneio. A regularidade não era a
sua característica. Isso acontecia
não porque era sonolento. Como
Alex atuava numa faixa estreita,
da linha de meio-campo à área e
tinha pouca mobilidade, era com
frequência anulado. Agora, ele está mais magro, rápido e se movimentando por todos os lados.
Mas não foi a perda de peso a
principal causa de suas ótimas
atuações, e sim o desejo e a obsessão de recuperar o prestígio.
Outro motivo de sua ascensão
foi o fato de ser o craque do time.
Alex assumiu essa responsabilidade. Em todos os jogos, entrou
para decidir. Na seleção, ao lado
de tantos craques, ele precisaria
de mais tempo para ter a mesma
autoconfiança. Isso dificilmente
vai acontecer.
Pelo mesmo motivo, Dirceu Lopes, Ademir da Guia, Zé Carlos
(Cruzeiro) e outros cracaços de
seus clubes não tiveram tempo
nem espaço para brilharem na seleção. Nem por isso deixaram de
ser excepcionais e inesquecíveis.
E-mail
tostao.folha@uol.com.br
Texto Anterior: Tênis - Régis Andaku: Cada vez menor Índice
|