São Paulo, sexta-feira, 04 de junho de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

XICO SÁ

Da poesia à autoajuda


A leitura reflete diretamente no estilo de jogo e na filosofia da seleção de Dunga e de Jorginho


Amigo torcedor, amigo secador, se o futebol do Brasil estava mais para a poesia do que para a prosa, como definiu o cineasta italiano Pier Paolo Pasolini, nesta Copa do Mundo a seleção canarinho vai no melhor estilo da autoajuda.
Óbvio que teremos instantes de prosa e momentos de poesia -o contra-ataque seguido de gol, segundo o mesmo Pasolini, guarda algo de poético. A autoajuda, no entanto, prevalecerá.
O técnico Dunga aprecia o gênero, e Jorginho, seu auxiliar direto, distribuiu "O Futuro da Humanidade" (editora Sextante), de Augusto Cury, best-seller do ramo, para os jogadores.
O amigo pode ser um leitor voraz de obras motivacionais e gostar de um futebol bonito, assim como pode ser leitor erudito, quase um Jorge Luis Borges, e adorar uma medieval retranca à italiana.
No caso da comissão técnica da seleção brasileira, temos a coincidência: a leitura reflete diretamente no estilo de jogo e na filosofia do grupo.
Não se deprima, amigo, os tempos mudaram, e a definição das linguagens futebolísticas, também.
Não custa nada, todavia, dar um replay no ensaio romântico de Pasolini, coisa dos anos 1970:
"Quem são os melhores dribladores do mundo e os melhores fazedores de gols? Os brasileiros. Portanto, o futebol deles é um futebol de poesia -e, de fato, está todo centrado no drible e no gol. A retranca e a triangulação é futebol de prosa: baseia-se na sintaxe, isto é, no jogo coletivo e organizado, na execução racional do código.""
É, meu querido, onde queres Drummond, sou autoajuda, cantariam os chefes da atual equipe verde e amarela. E tem mais: o que sabe um diretor de cinema sobre o mundo da bola? Seria a mesma coisa que escalar o Dunga para dirigir "As Mil e Uma Noites", questionariam também a este mal diagramado cronista.
Tá legal, aceito o argumento.
Mas deveriam, na qualidade de bons leitores de autoajuda -gênero conhecido vulgarmente entre os boleiros como "vamos lá, moçada!"-, adotar outras lições de casa. Penso, por exemplo, no volume "O Que Podemos Aprender com os Gansos" (Panda Books), de Alexandre Rangel.
Como bem sabemos, quando os gansos batem as asas, em um voo coletivo em forma de V, cria-se um vácuo para o companheiro passar, e todos têm um desempenho 71% melhor do que se voassem sozinhos. É ou não uma das grandes características da brilhante ave homônima do Santos Futebol Clube?

xico.folha@uol.com.br


Texto Anterior: Soweto vive dia de feriado e grita por Kaká
Próximo Texto: Dunga elogia educação no Zimbábue
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.