São Paulo, terça-feira, 04 de julho de 2006

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Ballack e Schneider marcam esteio político

Dupla representa área oriental do pós-guerra

ENVIADO ESPECIAL A BERLIM

Michael Ballack é o capitão e astro do time. Bernd Schneider é um meia habilidoso, que alia eficiência na marcação a um toque de bola refinado. Ambos são queridos pela torcida. Mas, para um grupo de alemães, seus feitos transcendem o gramado.
Apesar de o país já estar unificado e o muro que separou pessoas e ideologias ter tombado há 16 anos, os dois jogadores atuam como uma espécie de redentores para uma região que ainda guarda, ao menos no futebol, cicatrizes da divisão que perdurou por quase 45 anos.
Dos 11 titulares normalmente escalados por Jürgen Klinsmann, Ballack e Schneider são os únicos que nasceram na antiga Alemanha Oriental, região praticamente ignorada por organizadores da Copa e pelas seleções que disputam o torneio.
Doze cidades abrigaram jogos, mas só Leipzig integrava a antiga República Democrática Alemã. Dos 32 times que começaram a disputa, só dois -os anfitriões e a Ucrânia- treinaram em localidades comandadas por comunistas até a queda do Muro de Berlim, em 1989.
"Não é uma segmentação deliberada. Essa diferença apenas reflete a economia atual do país", explica à Folha Peter Gottschlich, cientista político da Universidade de Hottsock. "Só que, especialmente para os mais velhos, tal diferença entre leste e oeste machuca. A origem de alguns jogadores de futebol então vira motivo de orgulho. Eles parecem vingar um povo que se diz excluído."
Os salários pagos em cidades que integraram a parte ocidental são 35% superiores à remuneração das cidades orientais, discrepância que influencia o esporte. "Os clubes não têm dinheiro para manter grandes estádios nem para trazer craques. Assim, o futebol na antiga RDA perdeu fôlego. Como então atrair espaço em um Mundial?", indaga Gottschlich.
O único time da região classificado para disputar a divisão de elite do Nacional Alemão é o Energie Cottbus. A própria Leipzig, segundo o Comitê Organizador da Copa, só entrou na lista de cidades-sedes por sua importância histórica -lá foi fundada a federação alemã de futebol, em 1900. Mesmo assim, somente 5 dos 64 jogos acabaram realizados no Zentralstadion, cuja reforma custou 90 milhões (cerca de R$ 250 milhões).
Nem sempre a diferença foi tão exorbitante. Na Copa de 1974, a seleção da Alemanha Oriental chegou a derrotar a "outra" Alemanha, que depois acabaria campeã, por 1 a 0.
Foi neste cenário que Ballack, nascido em 1976, e Schneider, em 1973, cresceram.
O primeiro cresceu em Görlitz, cidade de 59 mil habitantes que fica a cerca de 200 km da capital Berlim. Ele viveu até a juventude na parte comunista do país. Em 1997, fechou com o Kaiserslautern.
Sua origem é evocada por historiadores para explicar quase todas as suas atitudes. Se demonstra liderança em campo, dizem que a criação na parte oriental moldou seu caráter.
Se anuncia um contrato milionário com o inglês Chelsea, voltam a dizer que a ganância é fruto da infância no socialismo.
Associações parecidas ocorrem com Schneider, criado em Jena (pouco mais de 100 mil habitantes). "Não acredito nesta causa. O local onde nascemos não explica cada passo de nossas vidas", diz Gottschlich.
O acadêmico crê, porém, que a situação está mudando. "Ballack e Schneider são vingadores para os mais velhos, para a geração que viveu sob a sombra do Muro de Berlim. Para os mais novos, são ídolos como os outros. Em 2010, ninguém se importará se um atleta nasceu na Alemanha Oriental ou Ocidental."0 (GUILHERME ROSEGUINI)

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