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ANÁLISE
O que quer se desenvolver, o Rio ou a Barra?
SERGIO MAGALHÃES
ESPECIAL PARA A FOLHA
É excepcional a oportunidade oferecida para o desenvolvimento do Rio de Janeiro como
sede dos Jogos Olímpicos.
As Olimpíadas, contudo, não
são uma panaceia para problemas urbanos. Degradação ambiental, crescimento de favelas
e violência não se superam por
mágica. Mas é justo esperar que
os investimentos previstos e o
sentimento de promoção da cidade possam estruturar uma
recuperação consistente.
Há dois condicionantes, porém: 1) o adequado tratamento
ambiental que venha a ser desenvolvido até lá, no sentido da
sustentabilidade urbana; 2) a
coerência entre a marca da cidade e o palco dos Jogos.
Por que isso pode preocupar?
Porque há uma questão urbanística importante: a ambiguidade quanto à região a ser desenvolvida prioritariamente. É
a cidade ou a Barra da Tijuca?
Entre os mais importantes
legados projetados está a despoluição da baía de Guanabara,
fundamental para a reestruturação urbanística da cidade.
Um segundo legado poderá
ser a revitalização do centro.
O centro do Rio é o seu lugar
histórico. Dispõe da melhor
acessibilidade e conexões metropolitanas. É o núcleo principal dos empregos. Seu processo
de esvaziamento tem se exacerbado pelo abandono de edifícios e áreas antes ocupados pelo governo federal.
Sofre também com o estímulo à ocupação da Barra, distante
40 km. Com 200 mil habitantes
(2% do total), a Barra tem recebido investimentos públicos
desproporcionalmente à sua
participação demográfica.
Embora os Jogos estejam
projetados para ocorrerem em
quatro áreas (sul, centro, norte
e Barra), é na Barra que se prevê a Vila Olímpica.
Algumas modalidades têm
exigências de lugar, como esportes náuticos, na lagoa Rodrigo de Freitas e em Copacabana (sul). Ou pelo aproveitamento de arenas existentes, como o estádio João Havelange
(norte) e o Maracanã (centro
expandido). Já os equipamentos da Barra, como a Vila, não
tem especificidade de localização. Ao contrário, é o bairro que
demanda a construção de infraestrutura para os Jogos.
A escolha da Barra foi justificada pela disponibilidade de
grandes áreas livres. Em que
pese a baixíssima densidade
populacional, que torna proibitivo investir em transporte de
massa, essa decisão seria a mais
adequada, já que não se vislumbrava outra região com áreas
passíveis de aproveitamento.
Mas, felizmente, as coisas
mudaram. O município anunciou como prioritário o desenvolvimento da região portuária
(centro), onde há grandes áreas
disponíveis, públicas, para cujo
aproveitamento já houve acordo entre Lula, o governador e o
prefeito. A sinergia que não havia antes, entre as decisões federadas, hoje é inconteste.
Tal disponibilidade tem potencial construtivo muito superior ao necessário para a Vila
e demais arenas projetadas. De
frente para a baía recuperada, a
Vila poderá servir de fomento à
moradia no centro, a sinalizar
novo século de desenvolvimento. Por certo se constituirá como o coração dos Jogos-2016. É
justo que assim seja, pois disporá da melhor infraestrutura de
transporte, com duas linhas de
metrô mais as três novas linhas
que poderão resultar da transformação dos trens suburbanos
em metrô, promovendo integração por transporte de massa
de 70% da população.
Assim, o palco dos acontecimentos olímpicos estará indissociado da imagem ambiental
do Rio. Os Jogos de 2016 podem representar o papel que as
obras de Pereira Passos desempenharam no início do século
20, quando a ideia de cidade
maravilhosa foi constituída -e
que, hoje, pode ser recuperada.
SERGIO MAGALHÃES é arquiteto, doutor em Urbanismo, professor do Prourb e da FAU-UFRJ
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