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FUTEBOL
"Não vai acontecer nada"
SONINHA
COLUNISTA DA FOLHA
É o que a gente pensa o tempo
todo. Quando sai para dar
"só uma volta" de moto ou de bicicleta sem capacete. Quando
atende o celular e segue dirigindo.
Quando bebe "um pouco" e dá
um mergulho ou sai dirigindo.
Quando coloca o filho no banco
da frente do carro. Ou no banco
de trás, mas sem o cinto. Quando
fuma. Quando deixa de usar preservativo. Quando solta balão.
Quando ultrapassa na faixa dupla. Quando toma remédio por
conta própria. Quando come demais ou se exercita de menos.
Serginho, ao que tudo indica,
sabia que devia parar de jogar futebol. Mas teve certeza de que não
ia acontecer nada, como a gente
sempre tem. Confiou em si mesmo; no fato de não fumar, não beber e não cair na balada. Não disse para a mulher que ia jogar até
os 40 anos? Confiou em sua fé e
em sua boa fortuna -após anos
como "vice" (dois Brasileiros,
uma Libertadores), foi campeão
paulista. Tudo estava dando certo. Não haveria problema algum.
A mulher, os amigos, todos concordaram com ele. Havia um risco "mínimo" de acontecer alguma coisa -mas a vida não está
sempre em risco? Pode-se bater a
cabeça em lance; pode-se bater o
carro a caminho do treino...
O médico do clube sabia exatamente do risco que ele corria?
Provavelmente. Teria sido convencido pelo próprio Serginho a
guardar sigilo sobre o diagnóstico? A minimizar, junto aos patrões, a dimensão do perigo? Vai
saber. O médico tinha a obrigação de alertar o clube, mesmo que
o jogador não quisesse fazê-lo?
Creio que sim. Mesmo que o jogador alegasse que sua vida só dizia
respeito a ele mesmo e que não
colocava ninguém mais em risco
(como faria um piloto de avião,
por exemplo)? Creio... que sim.
Se tivesse sido proibido de jogar,
Serginho talvez perdesse a vida
em depressão. Jogar era sua fonte
de orgulho, realização e prazer.
Talvez sofresse uma parada cardíaca subindo escada, dirigindo,
jogando uma pelada na praia. Se
fosse autorizado a jogar com todos os riscos assumidos, poderia,
quem sabe, ter se cercado de uma
estrutura hiperaparelhada para
socorrê-lo em emergências.
Mas mesmo com desfibrilador
portátil à beira do campo e médico, massagista, goleiro ou juiz supertreinado em ressuscitação, o
fim poderia ter sido o mesmo. Serginho podia ter uma síncope debaixo do chuveiro do vestiário.
Onde estaria o aparelho cobiçado? Onde estariam os médicos e o
motorista da ambulância?
Especular sobre o que poderia
ter sido feito (futuro do pretérito!)
é tortura, especialmente para
quem o amava e sofre mais com a
sua falta. Examinar cuidadosamente o que foi feito e tomar medidas para melhorar o atendimento em campo, a prevenção de
problemas e o nível geral de informação e responsabilidade é ótimo. Punir de maneira justa aqueles que tiverem errado é necessário. Mas não vamos esquecer que
nós também erramos em nossas
profissões, em nossas decisões pessoais e em nossas procrastinações.
Ah, e não vamos esquecer que às
vezes morremos, e não tem volta.
Aplausos
"Deus deu a ele a chance de se
despedir sendo aplaudido no
Morumbi." O sogro do Serginho fez o resumo mais emocionado -e emocionante- da
história.
Fim de uma era?
Em passado recente, corintianos vociferaram contra Antonio Roque Citadini por causa
de decisões desastradas (certas
contratações, por exemplo) que
acabaram deixando o time em
situação ridícula. Mas, salvo engano, muito do que a torcida
atribuía a ele tinha sido decidido por outras pessoas, como
Andrés Sanchez e Nesi Curi.
Que ganham força agora na
parceria com a MSI, enquanto
Citadini perde terreno. Registre-se: a "era Citadini" não foi
ruim como crêem alguns.
E-mail
soninha.folha@uol.com.br
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