São Paulo, segunda-feira, 05 de junho de 2006

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Com 850 mil mulheres nos gramados, país anfitrião acredita que Mundial vai empurrar uma nova geração de meninas para praticar o futebol

Menina dos olhos Alemãs vêem na Copa chance de novo boom

GUILHERME ROSEGUINI
ENVIADO ESPECIAL A MUNIQUE

"Brigitte" seria uma típica revista feminina não fosse o espaço dedicado ao futebol. No lugar de textos sobre jogadores considerados bonitos ou elogios ao metrossexual inglês David Beckham, a publicação debate aspectos táticos e técnicos dos elencos que a partir de sexta entram em campo na Copa.
Tal opção editorial pode soar estranha a um brasileiro, mas é natural na Alemanha. O público feminino não só pratica o esporte mais popular do planeta como o considera uma agradável opção de entretenimento.
Segundo a Federação Alemã de Futebol, cerca de 20% da capacidade dos estádios em partidas do Nacional masculino é preenchida por mulheres.
Mais: com a bola nos pés, as alemãs têm currículo recheado de conquistas -ganharam medalha de bronze na Olimpíada de Sydney-2000 e ficaram com o ouro no Mundial em 2003.
"A participação está aumentando a cada ano e um evento como a Copa vai empurrar uma nova geração de meninas para praticar o futebol. Se soubermos absorver tudo isso, vamos crescer mais. Na verdade, os clubes ainda têm muito espaço para receber jogadoras, já que podemos usar toda a estrutura que os times masculinos possuem", explica à Folha Sissy Raith, técnica do time feminino do Bayern de Munique.
Suas palavras dão apenas uma pista do tamanho deste boom. Em 1994, 600 mil jogadoras integravam 4.000 times na Alemanha. Hoje, 850 mil estão espalhadas por 7.000 equipes. Um incremento de 41,67% em 12 anos.
"Eu demorei para acreditar quando comecei a disputar os jogos oficiais. Os estádios estão sempre cheios e existem até torcidas organizadas formadas só por mulheres. Em campo, tudo é muito profissional. Para quem jogou no Brasil, é um outro mundo", explica Cristiane, 21, a brasileira mais bem-sucedida nos gramados alemães.
Após brilhar na Olimpíada de Atenas, em 2004 -o Brasil chegou à decisão, mas sucumbiu diante dos EUA-, ela firmou contrato com o Turbine Potsdam. De lá para cá, ganhou títulos nacionais e europeus.
No Campeonato Alemão que está em disputa, a atacante conta com sete gols. Sua meta é ampliar essa contagem ainda hoje, quando sua equipe enfrenta o Bayern de Munique.
Depois, o certame será interrompido para a Copa.
Cristiane, aliás, não vai acompanhar a seleção de Carlos Alberto Parreira. Não tem ingresso para os jogos. Trata-se, porém, de uma situação oposta à de suas colegas de equipe, cujo brilho nos campos rendeu privilégios concedidos por autoridades alemãs.
"É difícil de acreditar, mas cada jogadora da seleção alemã ganhou 15 entradas para usar no Mundial. E olha que os ingressos estão muito disputados. Acho que isso prova a importância que elas têm para o país", opina Cristiane.
Essa valorização ocorreu também nos bastidores e ajudou a romper um tabu. O quadro de diretores da Bundesliga, sempre dominado por homens, tem agora a presença de uma mulher: é Katja Kraus, que trabalha no clube Hamburgo.
Sua explicação para a febre do futebol feminino está na infra-estrutura. "As mulheres só passaram a ser assíduas freqüentadoras quando os estádios passaram a ter boa qualidade. Clubes com estádios mal conservados ainda não conseguem explorar esse mercado. Já as cidades que investiram em reformas visando os jogos da Copa estão colhendo frutos", afirma Kraus à agência de notícia Reuters.
Não são apenas jogadoras de futebol, praticantes eventuais ou cartolas que devem engrossar a audiência do Mundial.
Muita gente aproveitou a exaltação natural que precede um evento desse porte para oferecer informações e cativar novas audiências femininas que até então não demonstravam interesse pelo esporte.
Uma escola de Nuremberg, por exemplo, criou um curso de oito meses que esmiuça regras e ensina jargões da bola.
Duas jornalistas alemãs tiveram idéia semelhante e lançaram um livro bem-humorado com o objetivo de explicar para mulheres de torcedores o motivo de seus maridos "chorarem feito crianças" quando acompanham um jogo.
"É preciso compreender as regras para se emocionar com futebol. Algumas pessoas que dizem não gostar do esporte não sabem nem o que é um simples impedimento", escrevem Gaby Papenburg e Annette Pilawa, as autoras da obra.


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