São Paulo, quarta-feira, 05 de dezembro de 2007

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fim do silêncio

"Posso apanhar no clube", diz Dualib

Ex-presidente diz ter medo de sair de casa, assume parte da culpa pela queda e ataca Clodomil Orsi, mas isenta Andrés

"A parceria, aprovada por mais de 300 conselheiros, acabou se transformando na desgraça política de apenas um: eu", diz cartola


EDUARDO ARRUDA
PAULO GALDIERI
DA REPORTAGEM LOCAL

Alberto Dualib, 87, está com medo de sair de casa. Desde que renunciou à presidência do Corinthians, está recluso. Diz que pode ser agredido pela torcida por ter cometido, segundo ele, "um erro imperdoável" de ter feito a parceria com a MSI. "Posso ser agredido", contou. Ontem, ele aceitou conceder entrevista à Folha, mas só por e-mail. Sobre o rebaixamento, assumiu parte da culpa. Mas aponta como maior responsável o presidente interino Clodomil Orsi, que ficou entre agosto e outubro no cargo, e isentou Andrés Sanches.

 

FOLHA - Por que o Corinthians caiu para a Série B?
ALBERTO DUALIB -
Além do aspecto técnico, ou seja, caiu porque o time era limitado, creio que se criou um clima de derrotismo praticamente irreversível contra o Corinthians. Tanto se falou na queda, 24 horas por dia, minuto a minuto, no rádio, na TV, nos jornais e na internet, que o time não teve a mínima serenidade nos últimos dias.
Transmitir treino ao vivo pela TV, pelo amor de Deus! Os jogadores ficaram com mais responsabilidade do que se fossem soldados marchando para uma guerra que ameaçasse a soberania nacional. Tenho certeza de que a camisa estava pesando uns 50 quilos em cada jogador na partida contra o Grêmio.

FOLHA - A crise político-administrativa não teve influência?
DUALIB -
Claro que sim, seria ingênuo dizer que não. Mas o estatuto foi cumprido, uma nova eleição acabou sendo realizada, e nova diretoria, com plenos poderes, assumiu.

FOLHA - De quem é a culpa?
DUALIB -
Se você quer que eu assuma a minha parcela de culpa, tudo bem. Fui presidente até a 17ª rodada de um total de 38. O Corinthians tinha então 20 pontos ganhos, ocupava o 15º lugar. Quando pedi afastamento, o Corinthians tinha ganhado dois dias antes do Goiás e ainda faltavam 21 jogos, com 63 pontos em disputa. Veja que irônico, do Goiás. Foi minha última partida como presidente.
Agora, a partir daí, cada um tem que assumir a sua parte. Certo ou errado, eu não estava lá para decidir mais nada.

FOLHA - Qual a sua parcela de responsabilidade nisso?
DUALIB -
Querem dividir a culpa pela queda, mesmo eu não sendo mais presidente, mesmo tendo sido praticamente escorraçado do clube, faltando três rodadas para o fim do primeiro turno. Só que logo que assumiu, o presidente interino Clodomil tomou atitudes profundamente equivocadas. A demissão de Carpegiani foi uma delas. A sua substituição por um técnico das divisões de base, sem experiência, outra. A escolha de um vice de futebol há 20 anos afastado dos estádios, mais uma. A bola de neve foi se formando.
As pessoas se esquecem, mas também foram feitas novas contratações neste período de interinidade. Foram quatro jogadores que nunca aprovaram. Disso, não tenho culpa alguma.

FOLHA - Arrepende-se de ter feito a parceria?
DUALIB -
De uma coisa eu tenho certeza: fiz muitas coisas boas para o Corinthians. Em patrimônio e no futebol. Sob minha presidência, o Corinthians ganhou tudo, como nunca antes. Mas cometi tremendo erro, imperdoável para quem tinha minha experiência de vida: a parceria com a MSI. Sei que vão dizer: muitos avisaram e não ouvi. Mas, quando fiz a parceria, tinha certeza de que era boa para o clube. Acontece que a parceria, aprovada por mais de 300 conselheiros, acabou se transformando na desgraça política de apenas um: eu. Quando quis salvar de qualquer maneira a parceria, me iludi ainda mais.
Até o último instante acreditei que os recursos chegariam.

FOLHA - O que acha das críticas que o colocam como principal responsável pela queda?
DUALIB -
Ficou fácil culpar Dualib por tudo. Fui obrigado a renunciar, não tenho espaço para me defender. Se for a uma reunião do Conselho, corro o risco de ser agredido pela torcida e nem conseguir entrar na sede que construí e que é um de nossos orgulhos. Mas o Corinthians é forte, vai se reerguer. Quanto a mim, fiquei sem chão, sem perspectiva alguma.

FOLHA - O senhor acha que deixou uma herança maldita?
DUALIB -
Acho. Uma herança de R$ 51 milhões em caixa (R$ 30 milhões líquidos do Willian, R$ 3 milhões do Marcelo Mattos, R$ 18 milhões do Carlos Alberto). Agora pergunte a Clodomil Orsi, que só foi prestigiado por mim durante anos e, em retribuição, só soube me ignorar quando assumiu a presidência, o que ele fez com esse dinheiro.

FOLHA - Com a queda, acredita que possa ser eliminado do clube?
DUALIB -
Tenho idade avançada e, pela primeira vez na minha existência, sinto-me cansado. Mas ainda tenho discernimento. A exposição monstruosa de nossa crise no futebol se aplica na parte administrativa. Estou sendo julgado, como muitas pessoas são. Não fui condenado, mas me tratam como se tivesse sido. Ninguém se pergunta: e se a Justiça concluir que o Dualib não formou quadrilha alguma e não lavou dinheiro?
Como é que ficam os que me execraram, que falaram tudo o que quiseram a meu respeito? Tenho ouvido muito de parte da imprensa: "O Dualib roubou, deixou roubar". Sou empresário desde os 23 anos de idade, gerei ao longo da vida mais de 50 mil empregos, nunca fui sequer acusado por ninguém criminalmente do que quer que fosse. Se fosse processar todos os que me caluniaram, não faria outra coisa nestes últimos meses. E onde está uma única prova de que desviei dinheiro? Fiz uma parceria com pessoas erradas, que deixaram dívidas e problemas no Corinthians. Por conta disso, perdi o cargo para o qual fui eleito democraticamente. Picham meu nome nos muros. Mal posso sair de casa.
Não sou bandido, nunca fui. Trabalho desde os 13 anos. Com 87 anos, ainda trabalho. Qual o executivo que você conhece que trabalha com a minha idade? Mas a avalanche que caiu sobre mim pode influenciar, sim, o Conselho, no quesito eliminação.

FOLHA - O senhor se beneficiou financeiramente do Corinthians?
DUALIB -
Até meus inimigos sabem que sempre tive uma situação financeira mais do que confortável. Como minhas contas foram abertas, é fácil conferir. Um ano depois que fui eleito, em 1994, meu patrimônio pessoal e das empresas beirava os R$ 200 milhões. Em 2006, meu patrimônio era pouco mais de R$ 30 milhões. E ainda acham que me locupletei.

FOLHA - O que está achando da administração Sanches?
DUALIB -
Acho o Andrés bem intencionado, moço, com vigor. Ele pode reunir uma equipe nova, construir o futuro do Corinthians. O seu principal opositor, Paulo Garcia, é um homem correto, empresário de sucesso. Aproximou-se de mim no final de minha gestão, fez campanha e defendeu a aprovação de minhas contas. Sou grato a ele.

FOLHA - O que o Corinthians tem que fazer?
DUALIB -
Se sou tão criticado, por que quer minha opinião? Sei o que fiz no Corinthians: um Mundial, quatro títulos brasileiros, dois Rio-São Paulo, cinco Paulistas, cinco Copas São Paulo, duas Copas do Brasil, um Ramón de Carranza. A torcida que me agride nunca teve tanta alegria como nos 14 anos de minha administração.


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