São Paulo, domingo, 06 de maio de 2007

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"Meu pai recuperou o tempo perdido"

Ex-goleiro de Santos e São Caetano, Edinho afirma que período na prisão o ajudou a estreitar relações com o pai, Pelé

"Se não tive o pai ideal no meu crescimento, ele recuperou tudo isso nesse momento em que ficou do meu lado", diz o ex-jogador

DA ENVIADA A SANTOS
E DA REPORTAGEM LOCAL

Livre graças a um habeas corpus concedido pelo Supremo Tribunal Federal em dezembro de 2006, após um segundo período na prisão (dez meses) sob acusação de envolvimento com o tráfico de drogas, Edinho, filho de Pelé, pode hoje, enfim, conseguir aquilo que não alcançou como camisa 1 do Santos e do São Caetano. Um título. Na Vila Belmiro, ele experimenta um recomeço. Desde fevereiro, Edson Cholbi do Nascimento, 36, faz parte da comissão técnica de Vanderlei Luxemburgo, como auxiliar de preparador de goleiros. À Folha, ele falou sobre sua rotina no cárcere, o estreitamento de seu relacionamento com Pelé após os problemas com a prisão, seu melhor momento como atleta do Santos, em 1995, e o desejo de ser campeão. "Não seria mal começar com fama de pé-quente." (JULYANA TRAVAGLIA E PAULO GALDIERI)

 

FOLHA - Em 1995, você fez parte da equipe que conseguiu uma virada memorável na semifinal do Brasileiro contra o Fluminense. Como foi aquela noite no Pacaembu?
EDINHO
- Foi um jogo histórico, o mais emocionante da minha carreira. A gente tinha tomado uma goleada na primeira partida [4 a 1], mas o clima era de esperança e de muita apreensão. A história foi maravilhosa. Pena que o título não veio.

FOLHA - O que pesou para conseguir aquele resultado?
EDINHO
- Psicologicamente era a confiança. O talento e o empenho de todos e da torcida também contou. Nós tínhamos de fazer três gols de diferença. O Pintado deu a sugestão de que, se nós fizéssemos dois gols no primeiro tempo, que ficássemos no campo na hora do intervalo. A gente tinha certeza de que a torcida estaria vibrante, e não queríamos deixar esfriar.

FOLHA - Contra o São Caetano, o time atual também terá de reverter uma desvantagem. O que você pode passar de experiência?
EDINHO
- O aspecto psicológico. Se fizer 1 a 0 no primeiro tempo e 1 a 0 no segundo tempo, já está alcançado o objetivo, mas precisa jogar bola. Nos últimos jogos o time não tem atuado bem.

FOLHA - Qual foi o papel de Luxemburgo na sua volta ao Santos?
EDINHO
- Ele é uma das pessoas que me conhecem, sabe de tudo o que aconteceu. Infelizmente, quase nada do que foi divulgado é verdade. Tem gente que apenas ouviu notícia e criou uma imagem fictícia. Ele sempre acreditou em mim e foi fundamental para eu estar de volta à minha casa, que é o Santos.

FOLHA - Como você se sentiu na época de sua prisão?
EDINHO
- Fiquei frustrado com as coisas que foram divulgadas. Infelizmente, faz parte de quem sou, filho de quem sou. Não fui criado no Brasil e, até os 20 anos, nunca fui filho de ninguém. Fui criado pela minha mãe, tive uma vida normal de estudo e trabalho e, de repente, vim pro Brasil e joguei futebol. Às vezes esqueço dessa ligação que tenho e que me torna um alvo, como acabei virando. É claro que talvez eu tenha facilitado por conta de algumas amizades. Mas insisto na tese de que não cometi um crime.

FOLHA - Ser filho do Pelé atrapalhou você?
EDINHO
- Não é questão de ter atrapalhado. É uma realidade que às vezes eu esqueço, não me dou conta 24 horas por dia que sou sempre um alvo em potencial e que a qualquer momento eu posso ser usado. Talvez eu tenha sido imprudente, mas é a realidade. É o que sou. Nasci filho dele e tudo que tenho é graças a ele, por bem ou por mal. A gente não escolhe o pai que tem, então eu sempre agradeço por tudo o que ele pôde fazer por nós. Se ele não foi o pai ideal no meu crescimento, ele recuperou tudo isso nesse momento em que ficou do meu lado e passou por tudo isso junto comigo. Ele foi o meu representante enquanto estive preso, procurando o que era melhor pra mim, me preservando. Se atrapalhou [ser filho do Pelé] em algum momento, tenho certeza que ajudou em outro.

FOLHA - Como era a vida na cadeia? Os outros presos perguntavam sobre futebol?
EDINHO
- Existia essa curiosidade. Fui muito bem recebido, nunca tive nenhum problema ou dificuldade ou opressão. É claro que é um lugar complicado, com pessoas complicadas, mas a gente aprende a se virar.

FOLHA - O que aprendeu lá que você consegue aplicar agora?
EDINHO
- Aprendi a dar valor para as mínimas coisas da vida. Quando você perde a sua liberdade, cria uma nova maneira de ver as coisas e sempre ter força para superar as dificuldades. Conheci pessoas passando por situações muito piores que a minha. Aprendi a ser mais prudente, a saber quem sou e quem represento e tomar mais cuidado com minha conduta.

FOLHA - Como era a sua rotina enquanto esteve preso?
EDINHO
- No primeiro [presídio, em Arthur Bernardes] não tinha atividade nenhuma. Em Tremembé, trabalhava na lavanderia e tinha horário de tomar sol, campo de terra para bater uma bolinha com o pessoal e muita leitura. Agora a rotina é mais agitada. Trabalho nos treinos diariamente e à noite faço faculdade de educação física. A vida está maravilhosa.

FOLHA - Se o Santos ganhar, será seu primeiro título...
EDINHO
- É claro que é bem melhor ser campeão como jogador, mas não vai ser nada mal começar a carreira com a fama de pé-quente.


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