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CARLOS HEITOR CONY
Baixo astral
Faz parte de nossa maneira de
caminhar pelo mundo. Somos
um povo assanhado, mas qualquer dificuldade, qualquer
ameaça de tropeço fazem a gente
desabar. Conflitando com a realidade do dia-a-dia que dura há
quase 500 anos, não temos vocação para os segundos lugares.
Apesar de medíocres e profanos,
como Horácio odiamos o vulgar e
o profano, "odi profanum vulgus".
Daí que a imprensa francesa
começa a reclamar de nossa investida mediática, que traduzida
em vernáculo significa nossa capacidade de criar notícias que
ocupem a mídia. A dispensa de
Romário podia ter sido um fato
normal, mas houve tanta fofoca,
tantas informações contraditórias e despeitadas que obrigaram
a mídia internacional a se preocupar não apenas com a barriga
da perna do jogador, mas com a
pátria inteira, nela incluindo
nossas verdes matas, nossas borboletas de asas azuis e nossas lindas cascatas.
Nem havia acabado o caso Romário e logo surgiu outro caso,
este bem mais chegado à maledicência e, por isso, bem mais letal
do que o primeiro. Rosnou-se durante a semana, ao longo do Sena, das naves sombrias da Notre
Dame ao ensolarado jardim de
Luxemburgo, que saiu briga feia
entre os jogadores brasileiros, que
Edmundo (sempre ele) havia
agredido um companheiro, que
apesar dos 3 a 0 em cima de Andorra o futebol brasileiro atravessa fase lastimável.
Os entendidos, que abundam
por aqui, com enormes credenciais penduradas no pescoço, exibem aquilo que antigamente chamavam de "sobrolho preocupado", achando que nada vai dar
certo. Mas os turistas brasileiros
que andam nas ruas com camisas
amarelas, falando alto e gastando pouco, esses não estão nem aí.
Para eles, o Brasil é campeão
por decreto, somos um celeiro de
craques, se os 11 ou 22 jogadores
pifarem, é chamar qualquer poste, ou 22 postes do Catumbi ou do
Brás, que dá na mesma. Mais ou
menos como será na próxima
eleição presidencial. Qualquer
poste será melhor do que FHC,
mas a Fifa e a Justiça Eleitoral
ainda não aceitam a participação de postes nessas contenda, a
menos que os regulamentos sejam mudados, o que não é difícil.
Enquanto o Brasil cria, agora
diariamente, fatos ou quase-fatos
que ocupam a mídia, a Argentina
recolheu-se a um comportamento
ascético, conventual. Nada de
noviços rebeldes, mas conformados operários da bola. O técnico
Passarella espalhou pela concentração avisos que poderiam estar
nas paredes de qualquer monastério medieval: "Seriedade - Humildade - Sacrifício".
Sou de um tempo em que a Argentina entrava em campo com
navalhas escondidas na meia, como no tempo dos Bórgias, que,
sendo espanhóis, eram ancestrais
dos Batistuta, Ortega, Gallardo e
Simeone. Para compensar, ainda
temos Edmundo, que sozinho vale por todos eles.
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