São Paulo, domingo, 06 de setembro de 2009

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PAULO VINICIUS COELHO

Quando o recorde é pouco


Robinho pode deixar em sua carreira uma lista de lances geniais ou uma obra completa; dele espera-se a eternidade

ROBINHO completaria ontem sua 40ª partida consecutiva pela seleção. Recordista de escalações na era Dunga -jogou 46 dos 47 jogos-, o atacante do Manchester City se tornaria o homem que mais vezes disputou jogos seguidos com a camisa amarela. Nesse critério, esqueça Pelé, Zico, Romário, Leônidas... O cara é Robinho. Ou melhor, o número é de Robinho.
O segundo colocado nessa marca de importância discutível é Emerson Leão. "Quando um jogador está bem, não dá tanta atenção a esse tipo de informação. Eu não sabia que era o recordista", diz o ex-goleiro.
Leão jogou 38 jogos consecutivos pela seleção, entre 1976 e 1979, reflexo de seu melhor momento no futebol. Só não foi titular, entre a Copa de 1974 e a estreia de Telê (que não era lá muito seu fã), quando o Brasil foi representado por seleções regionais. Por exemplo, quando foi jogar em Rosario, pela Copa América de 1975, representada por Minas Gerais. Fora isso, o goleiro era Leão.
Com Dunga, a camisa 11 foi sempre de Robinho. Sempre! A única exceção foi a derrota para Portugal, em fevereiro de 2007, quando ele estava machucado. Esqueça essa: a seleção é Robinho e mais dez.
Isso deveria significar que Robinho sempre joga bem quando se veste de amarelo. Que é sempre procurado por seus colegas em campo, sempre é referência da equipe. Era assim até a conquista da Copa América de 2007. Mas, hoje, a seleção é de Kaká, o craque, de Luis Fabiano, o artilheiro, de Lúcio, o capitão, de Júlio César, a segurança. Robinho é, no máximo, o coadjuvante.
Robinho diz ter atingido um nível que faz suas apresentações no clube se tornarem indiferentes para ser ou não convocado. Quando se está no início de carreira, ou você vai bem em seu clube ou não é nem cogitado para a seleção. Quando é jogador de seleção, desses presentes em todas as convocações, como Robinho, pensa que o clube não faz diferença. Faz.
Leão tem explicação para o que se passa com seu ex-pupilo: "Antes, o Robinho tinha a ambição do drible e a alegria do gol. Hoje, isso parece lhe faltar". Há dois anos, Leão costumava receber telefonemas de Robinho, que começavam com uma frase simbólica: "Fala, Leão! Aqui é o melhor do mundo do ano que vem!".
A frase se parece com o cartaz à mostra em quitandas e padarias do interior do Brasil: "Fiado, só amanhã!". Robinho segue sendo o melhor do mundo do futuro, até que se perceba que essa expectativa ficou no passado. Esqueça até o que fez contra a Argentina. Hoje, Robinho é reserva do Manchester City. Pode?
"Quando ele dizia ser o melhor do mundo do ano que vem, eu respondia: "Então, precisa melhorar'", lembra Leão. Que Robinho é um talento e deve estar na Copa do Mundo, ninguém é louco de negar. Mas ele pode passar pela carreira deixando apenas uma lista de lances geniais ou uma obra completa. Jogar bem ou mal contra a Argentina faz pouca diferença para essa conta, porque Robinho é daqueles de quem se espera a eternidade. Que seja Chico Buarque, Caetano Veloso. Que não seja Belchior.
É para ficar na história como um craque, não como um malabarista. Ou apenas como um recordista.

pvc@uol.com.br


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