|
Texto Anterior | Índice
FUTEBOL
Macaquitos e favelados
MÁRIO MAGALHÃES
COLUNISTA DA FOLHA
Os argentinos têm o jogo
nos pés, vencem por 2 a 0, e a
torcida em peso canta: "Siga, siga,
siga; siga o baile no compasso do
tamborim; que nesta noite nós f...;
os negros do Brasil". De vez em
quando, ataca com gritos de "macaquitos". Na decisão do Pré-Olímpico de 96, ali na cancha de
Mar del Plata, o fervor futebolístico se confunde com o racismo
mais baixo.
O jogo entre as seleções que
meses depois serão engolidas pelos africanos da Nigéria, na Olimpíada de Atlanta, impressiona
menos do que a malta. Não páram de achincalhar "os negros do
Brasil".
É sempre assim quando equipes
dos dois países se enfrentam.
Lembro bem da noite fria de Buenos Aires no primeiro jogo das finais de 94 da Libertadores, Vélez
Sarsfield contra São Paulo. E da
final da Copa América de 2004,
quando os jogadores brasileiros
denunciaram com determinação
inédita como os argentinos provocam em campo com palavrório
nazistóide.
Agora é a Europa que vive onda
de intolerância. Em confronto do
Real Madrid com o Bayer Leverkusen, uma torcida espanhola de
extrema direita imitava macacos
quando negros do time alemão
pegavam na bola. Repetiram a
dose em partida da Espanha
contra a Inglaterra. Torcedores
branquelas do Getafe aprontaram com o camaronês Eto'o, do
Barcelona.
Não é de espantar que chegue
aos estádios o estrupício neonazista. E num antigo bastião de
fascistas como a terra de Franco,
hoje um Estado democrático. O
mais lamentável é a condescendência dos chefões do futebol com
os falangistas. Comunicado do
Real (onde jogam os mulatos Ronaldo e Roberto Carlos) informou
que o presidente da Uefa, Lennart
Johansson, viu "comportamento
correto do público" espanhol.
Na festa do centenário, a Fifa
expôs placas contra o racismo. Divulgou que faria dessa campanha
sua "bandeira social" mais importante. Seu presidente, Joseph
Blatter, disse: "Temos que agir de
maneira forte". Mas, tolerante
com o intolerável, multou a Real
Federação Espanhola no equivalente a ridículos R$ 87 mil pelos
insultos aos negros do English
Team. Ou seja: deixou para lá.
No Brasil, nem isso. Ignora-se
iniciativa da CBF contra os torcedores argentinos. Nos nossos estádios, as manifestações são mais
sutis, mas existem. O que são as
rimas grotescas, das torcidas dos
clubes ditos de elite, contra nações
populares como as de Corinthians
e Flamengo? Declamam: "Ela,
ela, ela, silêncio na favela!". Como
se até a festa tivesse que ser privilégio de bacana.
O jogo em Mar del Plata não
acabou 2 a 0.
Um garoto de origem muito pobre, trocado com o Botafogo por
algumas dezenas de pares de chuteiras, deu o chute de fora da área
que anunciou a virada. O negro
Beto é destro. O chutão do gol,
salvo drible da memória, foi de
canhota. Em seguida, Sávio empatou. O empate deu o título ao
Brasil. E os racistas voltaram tristes para casa.
Cabeleira
Do leitor Maurício de Campos
Araújo, sobre Ronaldinho: "Ele
tem orgulho de ser negro e não
tem vergonha do seu cabelo,
apesar de muitos acharem feio.
(...) Alguns ídolos preferem raspar seus cabelos, para as pessoas não lembrarem que são
negros (...)".
Pau oco
Juca Kfouri está certo: daqui a
pouco vão santificar Vanderlei.
Como se o sucesso do técnico
apagasse os erros do cidadão.
Gogó
Em outros tempos, dizia-se de
cineastas bem-falantes: o filme
é uma droga, mas a entrevista
foi ótima. Oswaldo de Oliveira,
técnico de talento, tem no Santos o desafio de provar que é tão
bom treinando quanto falando.
E-mail
mario.magalhaes@uol.com.br
Texto Anterior: Boxe - Eduardo Ohata: Unificação de um mesmo título Índice
|