São Paulo, quinta-feira, 07 de agosto de 2008

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TIRO

Atiradores festejam as vantagens do ar ruim

Sem céu azul, competidores distinguem melhor os discos

DO ENVIADO A PEQUIM

A poluição encobre Pequim com uma névoa branca. Nos dias que antecedem o início dos Jogos, o céu azul é raro. Só depois de chuvas constantes os resíduos tóxicos são dissipados. É assustador para os atletas que atuam em competições de resistência ao ar livre.
Maratonistas desistem de correr, ciclistas cogitam utilizar máscaras para filtrar o ar tóxico, triatletas se preocupam com o fôlego, remadores partem para o sacrifício.
Nem todos, contudo, condenam as más condições ambientais. Para o australiano Mark Russell, do tiro ao prato fossa dupla, quanto mais poluído estiver o céu, melhor. Detentor de um ouro (Atlanta-96) e uma prata (Sydney-00) olímpicas na prova, Russell diz que encontrou poucos lugares no mundo com condições tão favoráveis para atirar como em Pequim.
"É o melhor que pode acontecer para um sujeito velho como eu", brincou o australiano, 44, em entrevista coletiva.
Em sua prova, o atirador tem como desafio acertar dois pratos lançados em ângulos e alturas diferentes. "Consigo distinguir muito melhor aqueles pequenos discos laranjas no céu graças a esse perfeito contraste com o branco", explica.
Para Volney Vieira de Mello, chefe de equipe olímpica de tiro esportivo do Brasil, essa prova é realmente a mais beneficiada pela má qualidade do ar.
"Em outras competições, como a de pistola de ar, da qual iremos participar, isso é indiferente", constata Mello, referindo-se a Júlio Almeida e Stênio Yamamoto, que competem em salas climatizadas, com ar-condicionado. "O ar poluído só prejudicaria caso Pequim estivesse na altitude", acrescenta.
A desistência de Haile Gebrselassie, recordista mundial da maratona e asmático, de correr os 42,195 km em Pequim detonou uma crise para os organizadores. Preocupados, decidiram tomar medidas de emergência.
O rodízio de carros se intensificou, fábricas fecharam as portas ou se deslocaram para locais distantes, a construção civil acabou paralisada, usinas de carvão foram substituídas.
Se a eficácia das iniciativas é limitada, há quem reclame até das pequenas melhorias.
"A vista está mais bonita do que a de alguns meses atrás, quando estive aqui. Mas, para ser honesto, essa mistura de neblina com poluição é o que realmente nos ajuda", admite Russell, atirador há 30 anos.
Os sinais preocupantes esboçados por Russell são festejados por seu comitê olímpico.
"Temos examinado o problema e verificamos que há melhora", diz Peter Montgomery, vice do comitê australiano.
"Não tivemos nenhum atleta que tenha expressado o desejo de retornar para casa. Não é um problema que preocupe nossa delegação", afirma o dirigente.
Na contramão do discurso dos cartolas de seu país, Russell torce para que os chineses voltem atrás em suas resoluções para diminuir o nível de poluentes. "Para mim, quanto mais carros eles puderem colocar nas ruas no dia em que vou competir, mais feliz eu ficarei", afirma.
(ADALBERTO LEISTER FILHO)



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