São Paulo, sábado, 07 de novembro de 2009

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JOSÉ GERALDO COUTO

Por via das dúvidas


No campo da religiosidade no futebol brasileiro, entram as seitas evangélicas e sai a macumba (mas não de todo)


LEIO NA revista "Placar" deste mês que os jogadores do Avaí, de Florianópolis, creditam boa parte do belo desempenho da equipe no Brasileirão à atuação do guru espiritual Johnny Monteiro, braço direito do técnico Silas e um dos líderes dos Atletas de Cristo.
A seleção brasileira também tem seu "orientador espiritual", o pastor e ex-atleta Anselmo Alves. Contratado pela CBF, ele viaja com a delegação. De acordo com a edição de setembro da mesma "Placar", 11 dos 22 jogadores que provavelmente irão à Copa-2010 sob o comando de Dunga fazem parte do "grupo de orações" da seleção. Alguns são católicos, mas a maioria é evangélica, assim como o auxiliar técnico Jorginho, que participa das rezas.
Segundo Johnny Monteiro, que tentou em vão converter ninguém menos que Maradona quando esteve com Silas na Argentina, nos anos 90, há hoje cerca de 7.000 atletas de Cristo no Brasil.
Tudo indica que está havendo uma grande mudança religiosa e cultural no nosso futebol. Os boleiros são cada vez menos adeptos das crenças afro-brasileiras, como o candomblé e a umbanda, e cada vez mais seguidores de seitas evangélicas como a Renascer e a Universal.
Nos clubes, saem os pais de santo, que muitas vezes recebiam salários como membros extraoficiais das comissões técnicas, e entram os pastores, com o discurso moralista, pragmático e argentário dos evangélicos à moda norte-americana.
Futebol e religião sempre estiveram ligados no Brasil. Os padres de colégios católicos de elite, como o São Luís, de São Paulo, estão entre os introdutores do esporte no país, já nos anos 1880, antes portanto do próprio Charles Miller.
Consta que os jogadores Telê (que não era Santana) e Oscarino, ambos do América, foram os primeiros a recorrer regularmente à umbanda, no final da década de 20. Oscarino, que fazia sinais sobre a bola na hora da cobrança de um pênalti (a favor ou contra), foi pai de santo da delegação brasileira na Copa Rio Branco de 1932, no Uruguai.
Outro pioneiro foi o zagueiro Jaú, do Corinthians e do Vasco, que chegou a atuar pela seleção na Copa do Mundo de 1938. Depois de pendurar as chuteiras, ele virou o pai de santo Pai Jaú. Saiu do Corinthians brigado, porque o acusaram de receber suborno do Palmeiras.
Numa das fases de vacas magras do clube, dizia-se que Jaú tinha enterrado um sapo num dos gols do Parque São Jorge. Corintiano fiel, ele negou a acusação até a morte, em 88, mas a lenda persiste ainda hoje.
Casos de pais de santos famosos são os de Eduardo Santana, o Pai Santana, do Vasco, e o de Miranilson Carvalho dos Santos, o Pai Nilson, do Corinthians. Mais recentemente, houve Robério de Ogum, intimamente ligado a Vanderlei Luxemburgo desde a época do Bragantino.
Robério foi para o Corinthians com o treinador, que, no entanto, rompeu com ele um tempo depois.
Uma irmã de Luxemburgo, a mãe Leocadia, mãe de santo no Espírito Santo, aconselhou o irmão, quando este estava no Corinthians, a espalhar galinhas d'Angola no gramado do Parque São Jorge para dar sorte ao time. Consta que as galinhas (ou suas descendentes) estão lá até hoje.
Por via das dúvidas.

jgcouto@uol.com.br


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