São Paulo, terça-feira, 08 de junho de 2010

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JOSÉ GERALDO COUTO

Em preto e branco


A Copa do Mundo é a esperança de transformar a África do Sul em uma "nação arco--íris" de verdade


AS SUCESSIVAS contusões de craques, alguns já alijados da Copa, outros ameaçados de corte, não arrefeceram o entusiasmo dos sul-africanos.
Todos parecem acreditar que o evento vai mudar radicalmente, e para melhor, a cara do país.
Tomara mesmo. Quase 20 anos depois do final do apartheid, as fraturas sociais e raciais são perfeitamente visíveis a olho nu.
A brutal concentração de renda se manifesta geograficamente. Muito mais do que nas cidades brasileiras, a divisão de territórios entre ricos e pobres é chocante.
Percorrem-se quilômetros e quilômetros de bairros ostensivamente de elite, em que não se vê sinal nenhum de pobreza: nem moradores de rua, nem ambulantes, nem sujeira. Quem vem do aeroporto e entra em Johannesburgo por essa região norte da cidade imagina que está no Primeiro Mundo. Isso de dia, pois, à noite, paradoxalmente, os problemas começam a aparecer.
Como os ricos praticamente só andam de carro, as ruas, mesmo as dos bairros chiques, têm uma iluminação pública deficiente.
Dos bairros pobres, então, nem se fala. Dá a impressão de que toda a verba pública é destinada para as estradas e para a limpeza urbana.
Os transportes coletivos quase não existem. Os ricos andam de carro, os pobres andam de lotação -vans superlotadas e dirigidas perigosamente por motoristas agressivos.
Em Soweto, vi um imenso terminal dessas vans, comparável em tamanho aos maiores terminais de ônibus de São Paulo.
Pode ser uma impressão parcial e falsa, mas é raro encontrar alguém, mesmo entre taxistas e policiais, que saiba dar informações confiáveis sobre localizações e percursos. Ninguém sabe os nomes dos lugares nem como chegar até eles. É o império do GPS. Quem não dispõe de um pena muito para chegar aonde quer.
Ao menos em Johannesburgo e Pretória, as únicas cidades em que estive até agora, a tal "rainbow nation" (nação arco-íris), como a África do Sul se autodenomina, ainda é um filme de ficção. A realidade é em preto e branco. O futebol, esperamos, pode ajudar a mudar isso.

jgcouto@uol.com.br


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