São Paulo, sábado, 08 de julho de 2006

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O professor aloprado

Fã das artes e dos astros, sarcástico, supersticioso e polemista, o francês Raymond Domenech tenta amanhã, em Berlim, na decisão do mais valioso campeonato de futebol do planeta, seu primeiro título como treinador

Jason Lee - 6.jun.06/Reuters
O técnico da França, Raymond Domenech, no último treino da sua equipe no Mundial, ontem, em Aerzen


FÁBIO VICTOR
PAULO COBOS
ENVIADOS ESPECIAIS A HAMELN

Numa Copa com tipos como Ricardo Lavolpe, Luis Aragonés e Luiz Felipe Scolari no banco, não é fácil parecer exótico. Mas, visto de perto, o técnico da França, Raymond Domenech, é uma das figuras que o futebol é pródigo em produzir.
Jogador violento, ator diletante, obcecado por astrologia, supersticioso, sarcástico e polemista, o homem que tem a chance de conduzir a França ao seu segundo título pode entrar para a história como um raro treinador campeão mundial sem nenhum título anterior no currículo. Em 21 anos de carreira, a máxima conquista que ostenta é um título da segunda divisão francesa à frente do Lyon.
Se der França amanhã, o Mundial terá premiado a teimosia, pois, se tem algo de que Domenech não pode ser acusado, é de falta de personalidade.
Soou como bravata todo o tempo, mas, agora que seu time está na final, é difícil não recordar que ele foi possivelmente o técnico que mais mencionou a data de 9 de julho durante a Copa. Desde o início, e mesmo com um começo claudicante da França, repetiu que estariam no Estádio Olímpico nesse dia.
"Foi a astrologia?", apressaram-se em questionar comentaristas. "Não, é mais profundo, é uma convicção de verdade, com tudo o que essa palavra carrega, é uma crença", disse.
Mas é difícil acreditar que não, dada a paixão do treinador pelo tema. Já no Mulhouse, o primeiro time que comandou, Domenech, que é de aquário, se recusava a ter mais de um atleta de escorpião em seu grupo. Alega que um escorpião anula o outro. Coincidência ou não, o meia Pires, um dos craques que ficaram fora da convocação para a Copa, é de escorpião.
As brigas de Domenech também invadem o campo dos astros terrenos. Ele insistiu em uma defesa sólida, escalando um só atacante, Henry, e acabou contestado por atletas, liderados por Zidane e Thuram. Bateu o pé e foi em frente.
O temperamento forte revelou-se já como jogador. Ficou marcado pela dureza, que muitas vezes descambava para a violência. Há a história de que em seu primeiro jogo pelo Lyon, aos 16 anos, lateral-esquerdo, quebrou a perna de um adversário. Não é verdade, mas jamais se preocupou em desmentir. Disse gostar que rivais sintam medo de enfrentá-lo.
Quando assumiu o cargo, em 2004, tinha como principal credencial o trabalho com as divisões de base da seleção, que iniciou em 2003. Renovou o time, com talentos como Ribéry, mas também acolheu de volta Zidane, Thuram e Makelele, que reviram a aposentadoria.
Já na época que treinava o time sub-21, impunha seu gosto pela cultura, levando o elenco a museus. Pouco antes de assumir a seleção, encenou peças, incluindo montagens de Tchekhov. Fez também um filme para TV, que jamais foi exibido.
Com fina ironia, encena também nas entrevistas coletivas.
Antes de enfrentar o Brasil, afirmou que achava exagerada a pressão em torno do árbitro. Fingindo que o estava defendendo, pressionou-o absurdamente. Fala espanhol, mas diz que não fala. Ouve e compreende perguntas em inglês, mas as responde apenas em francês.
Tem 54 anos e é casado com a jornalista Estelle Denis, 29, apresentadora de programa esportivo na TV M6, a quem foi acusado de favorecer com informações privilegiadas sobre a seleção. Em 2004, tiveram uma filha, Victoria, ou Vitória.


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