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Esporte desagrega espanhóis e reabre ferida separatista
Envoltos em polêmica, Catalunha e País Basco fazem jogo histórico em contraponto ao título mundial de basquete
Comercial de TV censurado em Barcelona incendeia nacionalismo, e país vê crescer sanha de autonomia esportiva das regiões
ALEC DUARTE
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma conquista esportiva
prestigiosa como o título mundial masculino de basquete, obtido no mês passado pela Espanha, deveria servir para unir e
pacificar o país. Deveria.
Mas na Espanha, onde nacionalismo e separatismo caminham divididos por uma linha
tênue, o esporte virou instrumento para acirrar os ânimos.
Hoje, o país que o basquete
não integrou verá, com o futebol, uma demonstração de força de regiões que há décadas
clamam por independência.
Catalunha e País Basco fazem um amistoso histórico no
Camp Nou 75 anos após o último confronto entre ambos.
O jogo ocorre sob a benção da
Federação Espanhola de Futebol, que autoriza as regiões autônomas a entrarem em campo
uma vez por ano -em 2002,
por exemplo, os catalães o fizeram contra a seleção brasileira
(e perderam por 3 a 1).
Não há gentileza por trás do
gesto dos cartolas. E a pequena
boa vontade se dissipou de vez
depois da veiculação de um comercial que, durante 15 dias,
colocou a Espanha de volta às
suas trincheiras e provocou
reações negativas até em Barcelona, capital catalã.
Na peça publicitária, um garoto vestindo a camisa da Catalunha é impedido de tomar parte numa pelada por outro, de
vermelho, como o uniforme da
"Fúria". O moleque só é aceito
no jogo ao tirar a camiseta.
O comercial literalmente enfureceu autoridades por todo o
país. O Parlamento espanhol
debateu sobre seu conteúdo,
mas considerou impróprio,
além de perigoso, censurá-lo.
Coube a um juiz de Barcelona tomar a providência, anteontem. Sob a alegação de que
o filme "incentiva a discriminação entre crianças", o comercial (bancado pelo órgão que
administra o esporte catalão)
teve a exibição impedida.
Como era de se esperar, a
proibição esquentou ainda
mais o amistoso -e a causa catalã. Torcedores prometem tirar as camisas assim que a seleção entrar no gramado hoje.
Entre os bascos, o desejo de
possuir uma representação
própria no futebol não é menos
latente. A ponto de o chefe do
governo regional, Juan José
Ibarretxe, imaginar seu "país"
numa Copa do Mundo.
A chama do separatismo, que
o esporte ajudou a cultivar, reacendeu inesperada e surpreendentemente depois do maior
triunfo da história esportiva da
Espanha: o Mundial masculino
de basquete, ganho no Japão.
Na Catalunha, que cedeu cinco dos 12 campeões, houve
quem torcesse contra o time
para não ver bandeiras espanholas em Barcelona.
O retorno do elenco, que deveria ser triunfal também para
os catalães, acabou jogando
uma banho de água fria no conhecido orgulho da região.
"Eu me sinto espanhol", afirmou, no desembarque, Pau Gasol, principal jogador da equipe
e símbolo do esporte catalão.
Foi um escândalo. Cobrado,
Gasol reformou sua declaração.
"Se houvesse uma seleção catalã, eu a defenderia com prazer".
Agora, é a vez de o futebol
contra-atacar. Na esteira de Gibraltar, os sonhos da Catalunha
tomam forma e se projetam. Se
o enclave administrado pela
Grã-Bretanha no sul da Espanha se tornará membro da Uefa
neste mês, por que uma seleção
catalã não pode virar "oficial"?
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