São Paulo, quinta-feira, 09 de janeiro de 2003

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FUTEBOL

Técnico afirma que foi um erro dirigir a seleção em 1983 e diz que está muito mais preparado agora do que em 1994

Parreira assume sem contrato nem salário

RODRIGO BUENO
DA REPORTAGEM LOCAL

Carlos Alberto Parreira entrou em um seleto grupo de treinadores que assumiram três vezes a mais famosa equipe de futebol.
Mas ele poderá fazer parte de um grupo menor, mas muito mais prestigioso. Até hoje, só o italiano Vittorio Pozzo ganhou duas Copas como técnico. Parreira, campeão em 1994, falou à Folha porque aceitou sentar de novo no banco da seleção brasileira e lutar por sua segunda Taça Fifa.
 

Folha - Como aconteceu?
Carlos Alberto Parreira -
Foi tudo muito rápido. A idéia era que eu fosse o coordenador. Não tinha nada até terça-feira à tarde. O Américo [Faria] chegou de viagem na segunda-feira. O Ricardo [Teixeira] marcou almoço para a terça. Zagallo ligou de manhã para mim e disse que ele [Ricardo] ia me convidar para treinador. Quando eu cheguei ao almoço já estava com a cabeça mais ou menos feita. Ficamos conversando, umas duas ou três horas, e chegamos a um acordo: montar a comissão técnica de 1994.

Folha - Mas o que de fato pesou na sua decisão de aceitar o cargo?
Parreira -
Foi todo um envolvimento. O Ricardo Teixeira conversou comigo. O Américo me ligou. O Zagallo me ligou. A oportunidade de trabalhar com Moraci, Jairo... Isso ajudou muito. Foi importante esse envolvimento, determinante para a decisão.

Folha - Você disse publicamente várias vezes que não seria nunca mais o técnico da seleção.
Parreira -
A coisa é tão complicada. Não achava certo falar da seleção. Mas não estava pensando em ser técnico. Não vejo problema em voltar em uma decisão. São situações que aparecem na vida. Não há uma coisa definitiva, para sempre. Quando acabou 2001, disse que não iria trabalhar, pois estaria na Copa. Depois, se aparecesse algo, pensaria. Aí veio o Citadini [vice de futebol do Corinthians]. O Corinthians é um dos grandes clubes do mundo. Não tenho condição de dizer não ao Corinthians, como não tenho condição de dizer não à seleção.

Folha - É de fato mais fácil para você assumir agora a seleção?
Parreira -
Para 1994, fazia 24 anos que a seleção não chegava à final da Copa, e a pressão era muito grande. Agora, estou mais maduro, consciente, experiente.

Folha - Você está feliz?
Parreira -
Tenho que estar feliz, pois fui chamado para treinar a maior seleção do futebol mundial.

Folha - Para alguns você só teria a perder como técnico, pois já ganhou uma Copa nessa função.
Parreira -
O que passou ficou para trás. Estou mais interessado no que vem pela frente. O que foi já está registrado. Me desprendi do fato de ter sido campeão mundial.

Folha - Você continuará ligado à Fifa durante sua gestão na seleção?
Parreira -
Eu continuo. Sou do Comitê Técnico. Sou chamado para cursos, aulas, palestras. Será melhor agora como técnico da seleção brasileira. Eles convidam, e a gente vai quando pode.

Folha - Você esteve com Zagallo na Copa de 74 na Alemanha. O que espera para 2006 na Alemanha?
Parreira -
As épocas são diferentes. A Alemanha, naquela ocasião, tinha um timaço. Caso contrário, não tinha vencido a Holanda. A Alemanha vai jogar em casa. Temos que ter respeito, pois as potências sempre ganharam em casa, menos o Brasil. Não acho que em quatro anos a Alemanha vá fazer um time como o de 74. Na Europa, a Copa é sempre mais difícil. O Brasil é o único time de fora que pode aprontar. Não sei como vai estar a Argentina. Temos a base de 2002 e mais alguns jovens surgindo. O Brasil vai fazer frente.

Folha - O que espera do jogo com Portugal, agora de Felipão?
Parreira -
Vai ser o segundo jogo dele e o segundo nosso. É um jogo de preparação. Interessante porque terá um treinador novo nas duas seleções. E por esse aspecto de ser contra um ex-técnico da seleção brasileira.

Folha - Como será seu contato com a seleção olímpica?
Parreira -
Vamos acompanhar de perto a seleção olímpica e dar apoio ao Ricardo [Gomes, técnico], em logística, em tudo que ele precisar. Temos que acompanhar de perto a Olimpíada porque com certeza a seleção sub-23 dará jogadores para a principal.

Folha - E o reencontro com as eliminatórias, agora mais compridas?
Parreira -
Eliminatórias são sempre complicadas. Para 94, ficamos pelo último jogo contra o Uruguai. Para 2002, pelo último contra a Venezuela. Mas é bom disputar. O time fica mais competitivo, a gente conhece melhor os jogadores. A França não disputou as eliminatórias, ficou de braços cruzados e, na hora do Mundial, não teve condição de competir. Em um ano e meio a dois anos, estamos com o time pronto. Mas não tem nada fácil. Os jogos contra o Uruguai, a Argentina e a Bolívia fora serão complicados.

Folha - Dá para comparar o Parreira de 1983 com o de 1991 e com o que assume a seleção agora?
Parreira -
A diferença é um abismo. Em 1983, não vou dizer que foi um erro de quem me convidou, mas posso dizer que foi um erro eu ter aceitado [assumir a seleção". Fiquei oito anos fora do Brasil e não acompanhei de perto o futebol aqui. Em 91, já estava no Brasil, não teve impacto. Estava por dentro e não foi tão complicado. Agora, apesar da responsabilidade, me sinto mais seguro ao assumir a seleção pentacampeã.

Folha - Hoje, você tem a opinião pública a seu lado. Muda tudo?
Parreira -
Isso dá segurança, te dá auto-estima. Mas a responsabilidade de corresponder a essa expectativa. Não quero jogar confete, mas, se estou de volta à seleção, eu devo ao Corinthians. Se não tivesse tido um ano tão bom ai [em São Paulo], não teria sido escolhido. Agradeço aos jogadores, à diretoria e à torcida.

Folha - Como será seu contrato?
Parreira -
Ficou conversado que será até a Copa. Não dá para fazer um contrato de seis meses ou um ano. É até o fim da Copa. Tem que ser assim. Vamos ainda assinar um contrato.

Folha - Quanto você ganhará?
Parreira -
Esse assunto ainda não resolvemos. Com certeza, não vai ser o salário do Scolari [cerca de R$ 370 mil]. Em princípio, não está acordado nada. Pelo menos que seja compatível com o que eu recebia no Corinthians [R$ 90 mil". É o que se espera.

Folha - Como a sua família recebeu a novidade?
Parreira -
O pessoal não recebeu bem a idéia. Pessoas da família são bombardeadas nessa situação. Mas tem suas vantagens... voltar ao Rio, minha cidade. Por algumas horas pensei: ""Minha vida... vai mudar tudo novamente". Mas as coisas acontecem. Conversei com minha mulher, as filhas.

Folha - Quem é o melhor jogador no Brasil na atualidade?
Parreira -
Não quero falar de atleta, pois qualquer nome pode parecer compromisso. Mas o melhor seria o Kaká. Acho que é ele.

Folha - Tem alguma coisa que você fez para a Copa de 1994 que você não fará agora?
Parreira -
Tudo o que foi feito em 1994 foi feito de acordo.

Folha - Ricardo Teixeira pode sair da CBF ainda neste ano. Isso te atrapalharia no trabalho?
Parreira -
Tenho meu cargo. E não acho que é político. É técnico.

Folha - Aceitaria ser presidente da CBF depois de 2006?
Parreira -
Isso não.

Folha - Mas você disse que não seria mais técnico da seleção...
Parreira -
A vida dá voltas, não determina seu rumo. Mas não levo jeito para isso [presidir a CBF].


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