São Paulo, sexta-feira, 09 de junho de 2006

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Análise

Na Alemanha, o oba-oba é contido

SILVIA BITTENCOURT
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Tendo investido bilhões de euros para fazer desta Copa um show impecável, a Alemanha já vem empolgando torcedores do mundo todo com bolas de aço gigantes, estádios de futebol com cobertura que muda de cor e outras atrações. Não há nada, porém, que convença os próprios alemães, um povo pessimista por natureza.
Assim como no ano passado não houve oba-oba depois que escolheram um alemão para papa, agora a empolgação com a Copa, se comparada com o Brasil, é contida. Os alemães mostram-se de uma racionalidade tremenda, mesmo frente a uma Copa do Mundo no próprio país.
Enquanto o Brasil se preocupa com o peso e as bolhas de Ronaldo, os jornais sérios alemães especulam sobre as conseqüências da eventual visita do presidente do Irã aos jogos, calculam a quantidade de lixo que a Copa produzirá e lamentam o fato de o evento não ter criado o número de empregos esperado.
Os alemães vêem problema em tudo, a começar pela comercialização do futebol, exagerada na visão dos consumidores. Também temem a confusão nas cidades por onde vão passar as seleções.
Eles podem até fazer festa na hora de receber um time, mas, no fundo, preferem o sossego, uma cidade limpa e parques intactos e vazios. Não surpreende o fato de quase 30% dos berlinenses afirmarem que, se pudessem, fugiriam da cidade nas próximas quatro semanas.
A pressão em cima dos alemães para passar uma boa imagem do país também vem dando muita dor de cabeça, já que a fama deles no quesito simpatia não é das melhores. Quando o logotipo da Copa foi divulgado, dois anos atrás, os jornais questionaram se os três rostos sorrindo e alegres, formando o número 2006 e chamando para o slogan "tempo para fazer amigos", realmente expressavam o espírito do povo.
Essa preocupação até levou várias instituições e empresas a enviar profissionais -policiais, garçons, taxistas- para cursos sobre como lidar de forma cordial com turistas. "Organizar seminários é tipicamente alemão", diz o psicólogo Arne Germann, da cidade de Aachen, para quem tais cursos não levam a nada. "Eles precisam simplesmente relaxar." Quando o assunto é futebol, os alemães também não relaxam e criticam o time, o técnico que vive fora do país e a falta de ingresso para os jogos. Uma minoria ínfima crê que o país ganhará a Copa.
Caso a seleção alemã emplaque e chegue perto da final, milhares de torcedores até irão às ruas para festejar. Mas certamente haverá quem reclame dessas manifestações patrióticas. Afinal, 60 anos depois de terminada a 2ª Guerra -o maior trauma do país-, muitos alemães ainda se sentem constrangidos na hora de gritar e torcer.


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