São Paulo, segunda-feira, 09 de junho de 2008

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SONINHA

Errado e sem graça


Ganhamos, perdemos, e nem ligamos. Já demos importância demais para a seleção; agora cansamos

OS grandes astros do showbiz, além de cobrarem altos cachês, fazem muitos pedidos as famosas dúzias de toalhas, frutas exóticas, limusines.
A seleção brasileira cobra caríssimo por suas apresentações, mas é bem modesta em suas exigências.
Aceita trajetos cansativos e jogar em gramados ruins, e não é muito seletiva quanto aos adversários. Assim, compromete todos os possíveis objetivos de suas apresentações pelo mundo: como treino, não valem grande coisa; a qualidade do espetáculo dificilmente satisfaz o público e o produto acaba perdendo seu valor.
Nos últimos dez dias, a seleção mais querida do mundo (ainda é? Por quanto tempo?) jogou duas vezes. Obteve uma vitória inédita contra o Canadá (depois de 2 empates em 2 jogos) e uma derrota histórica contra a Venezuela (foram 17 vitórias nos 17 jogos anteriores).
Analisar o trabalho de um técnico ou jogador depois de uma única partida é quase sempre injusto ou, no mínimo, precipitado. Mas tanto o lado de cá (torcedores, comentaristas) quanto o de lá (técnico e jogadores) forçam a barra às vezes, conforme suas tendências.
Se o time faz uma apresentação brilhante, quem advogava por aquela formação vai se gabar: "Se o técnico tivesse feito isso na última partida, teríamos vencido! É esse o meio-campo ideal." Já o comandante chamará atenção para sua grande sacada, mostrando que o ataque não teria funcionado bem se ele não tivesse montado a defesa com tanta competência. E pode até ter razão. O fato é que a torcida exaltará as qualidades de seus jogadores favoritos, e o técnico contará o resultado para seu cartel pessoal. "Estou invicto."
Se o Brasil vencer sem apresentar um grande futebol, a ênfase muda. Ainda que um ou outro jogador seja crucificado (não é raro), o técnico é sempre o grande vilão. (Até porque quem pode tirar de campo quem quiser, mas às vezes há exagero na crítica). Ao explicar o resultado, dirá que o futebol do país vizinho melhorou muito, que o adversário jogou muito recuado, que todos querem fazer o jogo da vida contra o Brasil...
Que "nós fomos superiores, mas eles tiveram uma chance e aproveitaram". Que houve erros individuais.
Que o campo era ruim, os jogadores estavam cansados da viagem e esgotados pela seqüência de jogos (ou fora de forma no começo da temporada). Que estava muito calor, muito frio, muito alto. Enfim, dirá tudo, menos que "o planejamento foi mal feito as datas, o trajeto, o estádio e o adversários foram mal escolhidos, os treinos não tiveram muito proveito e eu errei na escalação e posicionamento. Sem falar que demorei demais para substituir."
Em qualquer vitória, maximizará o valor do resultado e de seu trabalho, acusando os brasileiros de ingratidão. Em caso de derrota, minimizará seu peso, invocando toda sorte de atenuantes. Mas uma vitória como a de Seattle não é motivo para otimismo. Uma derrota para a Venezuela poderia ser um aceitável acidente de percurso, mas foi tudo tão mal feito que espero que o "alerta para corrigir o que foi de errado" se baseie em análise honesta do que foi "errado".
Se bem que a torcida também não está nem aí. Conseguiram tirar a graça.

soninha.folha@uol.com.br


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