São Paulo, sábado, 09 de outubro de 2010

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JOSÉ GERALDO COUTO

Brinquedo inquebrável


Mesmo sabendo dos bastidores sujos do futebol, renovamos sempre a ilusão e o encanto

ATRIBUI-SE ao chanceler alemão Otto Von Bismarck (1815-1898) a pitoresca frase: "As leis e as salsichas, é melhor não saber como são feitas".
O mesmo se pode dizer dos clubes de futebol. Conhecer suas entranhas é, em geral, uma experiência desagradável, como a da criança que desmonta o brinquedo que tanto a divertia e se vê diante de um amontoado inútil de parafusos e molas.
Depois da saída de Zico do Flamengo, que pôs a nu uma rede de intrigas dentro do clube, foi a vez de o capitão santista Edu Dracena relembrar em entrevista a crise que culminou na demissão do técnico Dorival Jr.
Dracena critica o comportamento abusivo de Neymar, lamenta a decisão final da diretoria e diz que a ferida não está cicatrizada.
Se lembrarmos também a horrenda briga entre Robinho e Wesley e o episódio dos jogadores santistas que ofenderam torcedores pela internet, o encanto dos "meninos da Vila" se esfarela diante de nossos olhos.
As baixarias internas não são, claro, privilégio dos clubes brasileiros. Trechos da inédita biografia de Ronaldo pelo jornalista italiano Enzo Palladini, publicados na "Gazzeta dello Sport", reacendem a discussão sobre o suposto uso de anabolizantes pelo jogador quando atuava pelo PSV da Holanda.
Palladini diz se basear em declarações do médico Bernardino Santi, ex-responsável pelo controle de dopagem da CBF, mas admite que não confirmou a informação com nenhuma outra fonte.
Se verdadeira, a denúncia de Santi é grave, pois muda toda a leitura que fazemos da atribulada trajetória de Ronaldo.
Mas o que mais me espanta, ao pensar nas mazelas do futebol, é a nossa resiliente capacidade de recuperar a inocência e o entusiasmo. Refiro-me tanto aos torcedores como aos comentaristas.
Bastou Paulo César Carpegiani e Vanderlei Luxemburgo estrearem com vitória, respectivamente no São Paulo e no Flamengo, para serem vistos como artífices de uma nova era para seus clubes.
O caso de Luxemburgo é o mais espantoso. Até a troca que ele foi obrigado a fazer por contusão (de Diogo por Diego Maurício) foi vista como inteligente. Voltou a ser o grande estrategista.
Esqueceu-se, num passe de mágica, de sua performance desastrosa no Atlético-MG, que ele deixou na zona de rebaixamento. Assim somos, desmemoriados e volúveis. Crianças crescidas, refazendo sem cessar nosso brinquedo.

jgcouto@uol.com.br


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