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FUTEBOL
Diversão, arte e muito mais
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
"Se a gente mudar o futebol, a gente muda o Brasil."
Quem disse isso foi o secretário-executivo do Ministério do Esporte, José Luiz Portella, no debate
especial promovido terça passada
pela ESPN Brasil, do qual tive o
privilégio de participar. Para
muita gente, a frase de Portella
pode ter soado absurda ou, no
mínimo, exagerada. Mas quem
compreende, ou ao menos intui, o
sentido que o futebol assume em
nosso país sabe que ele tem razão.
Não só o futebol, dentro do
campo, é uma forma de teatralização das relações sociais, conforme já demonstrou o antropólogo
Roberto Da Mata, como também
seus bastidores concentram o que
há de mais arraigado em nossa
política, em nossa cultura e em
nossa formação social.
Estão ali todos os vícios (o clientelismo, a corrupção, os conchavos pelo alto, a truculência dos
mais fortes, o servilismo dos mais
fracos, a falta de transparência, o
abuso do poder econômico) que
atravancam há séculos nosso caminho rumo a uma sociedade
mais justa e democrática.
Nesse contexto, as conquistas
óbvias e básicas que Portella tenta implantar -como a transparência das contas dos clubes e federações, com a devida responsabilização dos dirigentes por eventuais irregularidades- equivalem a uma autêntica revolução.
"Se a gente mudar o futebol, a
gente muda o Brasil." A frase continua ecoando na minha cabeça,
como um mantra.
Ao ver seu clube, que é sua segunda pátria (quando não a primeira), ser usado inescrupulosamente para fins escusos, o torcedor perde a confiança nas leis, o
respeito pelas instituições, a fé no
futuro. Ao ser maltratado quando tenta chegar a um estádio,
quando se aperta para comprar
um ingresso, quando busca em
vão um assento ou um banheiro,
o cidadão descrê da cidadania e
vê a democracia como uma miragem distante. Quanto mais turvo
estiver esse espelho do país, mais
triunfará o espírito do "salve-se
quem puder", do "cada um por si
e Deus contra".
Nestes tempos de mudanças
anunciadas, a prioridade é acabar com a fome -ou com a "subnutrição", que é o eufemismo em
voga. De acordo, claro. Sem comer, nem uma ameba sobrevive.
Mas o homem não é uma ameba, embora alguns homens possam ter o quociente de inteligência e/ou a dimensão moral de
uma. Como diziam os Titãs, a
gente não quer só comida. Quer
comida, diversão e arte. Por uma
razão simples: sem essas coisas a
gente não é gente.
No Brasil, o futebol é diversão,
arte e muito mais. É nossa auto-imagem, nosso projeto sempre em
construção, nossa utopia de um
país de festa, beleza, harmonia e
afirmação.
Um escritor (talvez Tchekov)
disse certa vez que a grande arte
mostra o mundo como ele é e, ao
mesmo tempo, como deveria ser.
Vi jogos de futebol assim, acreditem.
"Se a gente mudar o futebol, a
gente muda o Brasil."
Talvez fosse mais exato dizer:
"Para mudar o Brasil, precisamos
mudar o futebol".
Não uma coisa depois da outra,
mas as duas juntas.
Revendo o debate da ESPN Brasil, constatei que cometi um "flagrorosamente", quando queria
dizer "fragorosamente", claro.
Um erro fragoroso, pelo qual peço
desculpas.
Descanso tenso
A bela vitória do Palmeiras
sobre o Fluminense dá novo
alento ao time e muda todos
os prognósticos com relação
a suas chances de escapar do
rebaixamento. Uma coisa são
os números (que continuam
críticos), outra é o estado de
ânimo da equipe. Mas o Palmeiras teve, semanas atrás,
outros ameaços de recuperação, logo abortados. Neste
fim de semana, o time descansa -se é que é possível
descansar vendo os rivais jogarem e, possivelmente, conquistarem pontos. Convém
não fazer previsão nenhuma.
Serginho
A notícia triste do dia, ao menos para mim, é a decisão do
lateral Serginho de não jogar
mais pela seleção. Ele foi convocado 22 vezes (incluindo a
atual) e jogou dez vezes. Foi, a
meu ver, subaproveitado. Tinha (e tem) qualidade até para ser titular. Pena. Quem perde é o futebol brasileiro.
E-mail jgcouto@uol.com.br
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