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JUCA KFOURI
Apesar de você
Corria o ano de 1956 e eu,
menino de seis anos, convalescia de uma doença razoavelmente grave em Ilhéus, na Bahia, hospedado na casa de meu
saudoso tio Pacheco.
O Fluminense jogaria ali perto, em Itabuna, num domingo,
e ele prometeu me levar se eu
estivesse bem.
Quase sarei de excitação,
mas a danada da febre voltou
justamente na sexta-feira anterior. E o tio Pacheco foi franco ao dizer que o plano estava
cancelado.
Então, diante de minha decepção, ele me prometeu uma
surpresa para a manhã do
mesmo domingo do jogo.
E que surpresa!
Sou acordado no domingo
com a notícia de que a surpresa me esperava na sala.
E lá estavam o goleiro Castilho, Telê Santana, Pinheiro,
Escurinho, enfim, a delegação
do Fluminense!
Todos muito carinhosos, me
puseram no colo, me deram
autógrafos, me desejaram sorte
e prometeram que ganhariam
o amistoso em minha homenagem.
Quase 30 anos depois, ao receber Castilho e Telê num programa de TV, perguntei se eles
se lembravam de ter visitado
um garoto doente numa excursão do Flu à Bahia.
Castilho nem titubeou ao dizer que não só se recordava como tinha muita curiosidade
em saber que fim tinha levado
aquele menino, que parecia
muito mal de saúde e que, pensava ele, "acho que não sobreviveu".
Ao saber que o menino era eu
ficou tão comovido que quase
chorou e a entrevista se transformou numa festa, além de
motivo permanente para Telê
me gozar, ameaçando maliciosamente tornar público que eu
já tinha sentado no colo dele.
Tudo isso voltou na noite da
última terça-feira com o rebaixamento do Flu à terceira divisão, um golpe terrível para
quem aprendeu a amá-lo assim, de maneira tão extraordinária.
A dor que primeiro dói para
depois virar indignação (que
será devidamente extravasada
aqui na coluna de amanhã) é
profunda.
E além de Castilho, de Telê,
de Rivellino, de Branco, a queda me faz lembrar de Nelson
Rodrigues, que morre pela terceira vez, como o Flu, que desaparece lenta e gradualmente,
apesar de ser o clube mais vezes campeão carioca, apesar de
ser campeão brasileiro, apesar...apesar de você, como diria
Chico Buarque, cartola bandido, assassino dos sonhos das
crianças tricolores e até de
uma inesquecível manhã de
um adulto corintiano.
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