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São Paulo, terça-feira, 11 de março de 2003

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BASQUETE

One man show

MELCHIADES FILHO
EDITOR DE ESPORTE

O jogador está mais alto, ágil, forte e, sobretudo, resistente. Apodera-se de um espaço cada vez maior em uma quadra cujas dimensões permaneceram praticamente inalteradas. Por isso, nada evoluiu tanto no basquete (no futebol?) como a defesa.
A pontuação escasseia. Na América e na Europa. Entre homens e mulheres. Profissionais e amadores. A ponto de a NBA, desesperada com a esterilidade dos placares, ter concordado em derrubar a obrigatoriedade da marcação individual, aquilo que a distinguia do basquete global.
De fato, o jogo andava burocrático, às vezes insuportável. É que, na tentativa de viabilizar as cestas, os técnicos desenhavam todo o fluxo do ataque para as mãos dos seus cestinhas. Vivia-se a ditadura dos isolamentos, tão bem representada pelo Houston Rockets do pivô Hakeem Olajuwon.
A defesa por zona, imaginavam os teóricos, iria quebrar essa estrutura, fazer a bola girar e o jogo ganhar ritmo e inteligência.
Muito bem, passados três anos, qual o resultado da "revolução"? A média de pontos segue em declínio: de 95,5, em 01/02, para 94,7. Somente 10 dos 29 times atingem a precisão nos arremessos do torneio passado -a média desceu de 44,5% para 43,9%.
Mas, mais importante do que o placar, a dinâmica de jogo não mudou. Nunca o mano a mano, o isolamento, o egoísmo estiveram tão prestigiados na liga.
Há dez anos, apenas seis equipes respiravam -e sufocavam- pelas mãos de um cestinha.
Hoje, são 22 agremiações que confiam mais de 20% de seus arremessos a um só atirador.
Lembra-se do Chicago Bulls dos anos 90, da impressão de que só Michael Jordan chutava?
Lembra-se de Larry Bird, um dos atletas mais famintos da história da liga norte-americana?
Ao longo do hexacampeonato dos Bulls, Jordan acumulou 27% dos arremessos do time.
No último título do Boston Celtics (85/86), Bird respondia por 21,9% dos chutes.
Pois esses percentuais viraram poeira nas mãos da nova geração.
Kobe Bryant, que fechou fevereiro com mais de 40 pontos por partida, façanha inédita em quatro décadas, atira 28,8% das bolas dos Los Angeles Lakers.
E ainda perde para Allen Iverson, que concentra 29,2% das ações ofensivas do Philadelphia.
Tracy McGrady, 26,4% do Orlando, é outro que parece se inspirar no lendário apetite de Jordan.
Até o próprio Jordan, agora na versão 40 anos e no Washington, surge entre os "top 10" no ranking dos fominhas, com 23,6%.
No Boston, a ração de Bird não saciaria os companheiros de mesa Antoine Walker e Paul Pierce, ambos com 24,3%.
Não se trata, aqui, de desmerecer esses novos craques. É mesmo somente nos ombros de Iverson que um time borocoxô como o Philadelphia pode avançar.
Mas de atentar para os sinais de desequilíbrio do basquete mais competitivo do mundo -culpa em boa parte da apologia ao individualismo que, com a anuência da NBA, alimenta a indústria do entretenimento, dos videogames aos Sportscenters da vida.

Fome 1
Kevin Garnett (Minnesota), o melhor da temporada na avaliação desta coluna, aparece só em 13º no ranking dos fominhas. Tim Duncan (San Antonio), outro artífice do basquete total, vem em décimo.

Fome 2
Garnett não tira o equilíbrio do ataque de seu time. Mas é, de longe, quem mais desequilibra partidas na NBA. Seu "point differential" (o placar do Minnesota quando ele está em quadra) é de +24,4. Os gulosos Kobe Bryant e Tracy McGrady param em +11,1 e +10,7.

Fome 3
O pisca-alerta da NBA acendeu porque 75,8% dos times limitam seu ataque. No Brasileiro, trilham esse caminho 14 das 17 equipes: 82,3%.

E-mail melk@uol.com.br


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