São Paulo, domingo, 11 de junho de 2006

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Sonífera, Argentina ganha na estréia

Graças a duas jogadas de Riquelme, equipe marca com Crespo e Saviola, mas não empolga nem evita pressão do rival

Depois de sofrer 2 a 0, Costa do Marfim ameaça o débil coração de Maradona e vê Drogba fazer o primeiro gol do país em Copas do Mundo


CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A HAMBURGO

A Argentina que venceu a Costa do Marfim (2 a 1) parecia ter tomado a poção supostamente sonífera dada por seu massagista, na Copa de 90, aos brasileiros, eliminados pelo gol de Caniggia. Lembra-se?
O resultado, ontem, só não foi o mesmo, agora contra os argentinos, por dois motivos. Primeiro, a Costa do Marfim está longe de ser, mesmo nos melhores momentos, um Brasil ou uma Argentina (quando acordada). Segundo, um atleta de nível, como Juan Roman Riquelme, é capaz de decidir o jogo mesmo quando faz só duas boas jogadas em 90 minutos.
Foi uma delas que determinou o resultado: aos 38min, meteu a bola no vazio, entre dois zagueiros, para a entrada de Saviola, que, livre diante do goleiro, não podia perder o gol.
Mas, se o juiz belga Frank de Bleeckere anulasse o gol, acertaria, como acertou ao não anulá-lo, porque é questão de interpretação. Saviola não estava impedido, mas Hernán Crespo estava e, ao se deslocar no mesmo buraco em que Riquelme pôs a bola, o juiz poderia interpretar que desviou a atenção da zaga e deu liberdade a Saviola.
Seja como for, o fato é que a Argentina jogou a bola na direção do gol só quatro vezes (tantas quantas a Costa do Marfim). Duas entraram, e o juiz não viu uma que parece ter feito o mesmo: após escanteio, Ayala deu um coice de cabeça na bola, o goleiro Tizié pegou, largou, foi largando, a bola foi entrando, mas o juiz não podia ver. Pelo telão do Estádio de Hamburgo, a bola pareceu ter entrado.
Das quatro finalizações, duas surgiram de bola parada (o escanteio cabeceado por Ayala e o gol de Crespo, aos 24min, após cobrança de falta por Riquelme). Houve ainda um chute de Riquelme de fora da área, o único que exigiu a intervenção de Tizié na segunda etapa.
É difícil entender a atuação da seleção argentina. Amarrada, atrapalhada, não exibiu as características usualmente a ela atribuídas. Nem a decantada garra e o hábil toque de bola nem atuações individuais de qualidade. Sobrou -e fora do campo- tocar dos bumbos, o instrumento habitual da torcida argentina, assim mesmo mais por tradição do que por entusiasmo com a equipe.
Talvez a explicação esteja na escalação. Em vez de usar Lionel Messi, titular do Barcelona, hoje o melhor time da Europa, Pekerman preferiu um jogador (Saviola) do modesto Sevilla, além de deixar no banco o ídolo corintiano Carlos Tevez. Saviola fez, como Riquelme, duas jogadas: o gol, livre diante do arqueiro, e um drible entre as pernas do beque. Pouco, mas o suficiente para que, surpreendentemente, a equipe da Fifa o elegesse o "homem do jogo".
O paradoxo é que foi a Costa do Marfim que veio a campo com formação aparentemente defensiva: o técnico francês Henri Michel, que dirige a terceira seleção africana diferente em Copas, deixou no banco o segundo artilheiro do time, Aruna Dindane, o que pressupunha que só Didier Drogba, do Chelsea, ficaria na frente.
Engano. Como a Argentina não acordava, nem após ter feito 2 a 0, a Costa do Marfim foi, aos trancos, lançando-se ao ataque, a ponto de ameaçar o débil coração de Maradona, nas tribunas, com uma sucessão de quatro chances perdidas entre os minutos 29 e 34 de jogo.
No segundo tempo, não foi diferente. A Costa do Marfim ameaçou mais, até conseguir o gol, a oito minutos do fim. Gol que serviu de prova final do soporífero desempenho argentino: a bola foi cruzada da direita, Drogba não a alcançou, sobrou para outro cruzamento, da esquerda, que encontrou o atacante no meio da área, sem que um só argentino interviesse.
O técnico Pekerman admitiu que seu time "teve pontos altos e teve problemas" e, como é natural, prometeu ficar com "as coisas boas para melhorá-lo, aproveitando a confiança que dá o triunfo na estréia".


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