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Família em crise
Brigados fora de campo, os irmãos Boateng estarão em lados opostos no jogo entre Gana e Alemanha
RENAN CACIOLI
DE SÃO PAULO
Se não fosse pelo mesmo
sobrenome, Boateng, o zagueiro Jérôme e atacante Kevin-Prince provavelmente
não teriam mais nada em comum. A relação entre os
meios-irmãos, que defenderão seleções diferentes na Copa, chegou ao limite ontem.
"Kevin me disse: "Cada um
tem sua família, você tem a
sua, e eu, a minha". Isso é demais, não quero ter contato
com ele", afirmou Jérôme, 21,
defensor da Alemanha.
Kevin, 23, que já causara
polêmica em Berlim quando
decidiu defender Gana no
Mundial após passagens pelas seleções de base alemãs,
virou inimigo público do país
no dia 15 de maio deste ano.
Na final da Copa da Inglaterra, o atacante do Portsmouth atingiu o tornozelo direito do meia Michael Ballack, do Chelsea. O astro da
seleção dava adeus ao sonho
de disputar a Copa da África.
O Boateng mais velho pediu perdão, mas esperava
contar com o reforço das palavras do mais novo, figura
presente nas convocações do
técnico Joachim Löw desde
outubro do ano passado.
"Kevin acha que eu não
deveria ter dito que sua falta
[em Ballack] merecia um cartão vermelho", disse Jérôme.
A separação doméstica,
aparentemente motivada só
pela discórdia esportiva, tem
raízes bem mais profundas.
Filhos do mesmo pai, Prince, que deixou Gana em 1981
para tentar a vida na Europa,
foram criados pelas respectivas mães em bairros distintos
de Berlim, onde nasceram.
Nas mãos de Martina, uma
aeromoça da Lufthansa, Jérôme tornou-se um jovem tímido, e, depois, um profissional disciplinado. Não bebe nem fuma. Sempre teve
como meta chegar à seleção.
"Nunca pensei em jogar
por Gana. Não faz nenhum
sentido. A Alemanha é a minha casa", afirmou, certa
vez, a um jornal local.
Já Kevin cresceu em Wedding, bairro pobre da cidade
onde estrangeiros representam um terço dos moradores
e mais de 15 mil delitos são
registrados por ano. A mãe,
Christine, hoje uma enfermeira geriátrica, cuidou dele
e de mais quatro crianças.
Rebelde, porém extremamente habilidoso, o atacante
passou por todas as categorias de base da seleção.
Antes do Europeu sub-21,
em 2009, porém, foi cortado,
enquanto o irmão, Jérôme,
continuou no grupo que conquistaria o campeonato pela
primeira vez na história.
Dizem que atrasos constantes de Kevin culminaram
na dispensa e que, em virtude disso, ele aceitou o convite ganense. "Tenho orgulho
de ser africano", disse.
Apesar das diferenças, os
dois atletas conviveram durante infância e adolescência
até chegarem às categorias
de base do Hertha Berlin.
Agora separados, terão de
se reencontrar no dia 23,
quando Gana e Alemanha
duelarão na última rodada
do Grupo D, que conta ainda
com Austrália e Sérvia.
Depois, podem voltar a ser
rivais, já que Jérôme trocou
recentemente o Hamburgo
pelo Manchester City.
Assim, a história globalizada de dois alemães-ganenses que resolveram defender
bandeiras diferentes na África prosseguirá na Inglaterra.
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