|
Texto Anterior | Índice
FUTEBOL
Julinho no campo do mito
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
Morreu Julinho Botelho.
Como todo craque que teve
seu momento de brilho antes dos
jogos televisionados, ele pertence
ao terreno brumoso do mito.
Quem, como eu, tem menos de
50 anos quase não viu Julinho em
ação. Lembro-me apenas de ter
visto na TV alguns belos lances
dele na Copa de 1954, pelos quais
se pode deduzir que era um driblador infernal, mas com grande
senso de objetividade.
Dois episódios, muito lembrados, bastaram para construir a legenda de Julinho Botelho como
homem valente e de caráter.
O primeiro deles foi sua recusa
em servir a seleção brasileira que
iria à Copa de 58. Seu argumento
era singelo: como estava jogando
na Itália (na Fiorentina), achava
que devia ceder a camisa amarela
a alguém que estivesse atuando
no Brasil. Quem entrou na vaga
foi Garrincha (a outra era de
Joel), e o resto da história todo
mundo conhece.
Curiosamente, o outro episódio
célebre envolvendo Julinho também tem a ver com Garrincha. Escalado no lugar de Mané num
amistoso contra a Inglaterra em
1959, entrou em campo sob uma
das maiores vaias já ouvidas no
estádio do Maracanã.
É preciso levar em conta que o
sentimento bairrista era muito
mais forte naquela época, em que
os torcedores praticamente só conheciam os jogadores que atuavam em seu Estado.
Garrincha, além de ter brilhado
na Copa da Suécia, encantava os
cariocas semanalmente, com a
camisa do Botafogo.
Julinho, que passara mais de
três anos na Itália, era agora atleta do Palmeiras. Nessas circunstâncias, era natural que a platéia
do Maracanã o considerasse um
intruso, quase um usurpador.
Em vez de se deixar esmagar pela hostilidade geral, Julinho se encheu de brios e operou o milagre
de dobrar a multidão.
Diz-se que fez uma partida impecável. O fato é que marcou um
gol e deu o passe para o outro (de
Henrique) na vitória por 2 a 0. E
ao final da partida foi aplaudido
de pé pelos mais de cem mil torcedores que estavam no estádio.
Esse feito fabuloso inspirou
uma crônica memorável do escritor Nelson Rodrigues e ficou inscrito definitivamente na mitologia do futebol.
Diante de uma história como a
de Julinho, sempre me pergunto
se o lugar que esses craques do
passado ocupam em nossa memória afetiva foi beneficiado ou
prejudicado pela inexistência de
registros visuais de suas atuações.
Se alguém encontrasse casualmente rolos de filmes de jogos de
Leônidas da Silva, por exemplo,
será que ficaríamos abestalhados
ou decepcionados?
Não foram poucas as vezes em
que me vi traído pela memória
quando, assistindo a programas
do tipo "Grandes Momentos do
Esporte", confrontei minhas lembranças de velhos jogos com as
imagens reais dos mesmos jogos.
A memória é um terreno enganoso. Mais ainda a memória coletiva, transmitida oralmente ou
pelo texto de cronistas (por definição, seres imaginosos e pouco
confiáveis).
Seja como for, tenho um respeito quase supersticioso pelas grandes figuras do futebol dos tempos
míticos. Devemos tanto a eles que
poderíamos pendurar seus retratos em correntinhas no pescoço,
como se fossem santinhos ou
guias. Quem sabe assim, magicamente, adquiríssemos um pouco
da sabedoria, da fibra e da grandeza que, iludidos ou não, atribuímos a essas figuras.
Microfone do juiz
Cinco leitores atentos lembraram que a iniciativa recente da TV francesa de instalar um microfone no árbitro na transmissão de uma
partida de futebol não foi inédita. No Brasil, a convite da
Globo, José Roberto Wright
já havia apitado um Flamengo x Vasco devidamente
"grampeado". O resultado,
dizem, foi um festival de prepotência do juiz. O Vasco
tentou até anular a partida,
sob o argumento de que, dentro de campo, apenas Wright
sabia da existência do microfone. Esta foi, a meu ver, a
grande diferença entre as
duas experiências.
Tapando os buracos
Com Leonardo na direita e
Fabiano na esquerda, o São
Paulo soluciona seu maior
problema da temporada passada: a ausência de bons alas.
Já o Corinthians continua carente de um meia hábil e criativo. Alguém disse Adriano?
E-mail jgcouto@uol.com.br
Texto Anterior: Vôlei - Cida Santos: Façanhas e revelações Índice
|