São Paulo, sábado, 13 de dezembro de 1997.



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A lei Pelé ainda precisa ser revista

ANTONIO DE A. MACHADO RUDGE
especial para a Folha
Sem querer prejudicar, mas prejudicando, a chamada lei Pelé -proposta pelo ministro extraordinário dos Esportes, Edson Arantes do Nascimento-, mesmo com as alterações e emendas aprovadas pela Câmara, ainda pode trazer problemas e danos irreparáveis ao desporto brasileiro, em especial ao esporte amador, caso seja aprovada pelo Senado.
A iniciativa merece todo nosso respeito pelo justo motivo de visar o aperfeiçoamento da administração do esporte no país, mas peca por se preocupar quase exclusivamente com o futebol profissional.
Uma vez que a maioria dos clubes profissionais já tem seus representantes na Câmara dos Deputados, a CBC (Confederação Brasileira de Clubes, com cerca de 10 mil agremiações de esporte amador e de futebol filiadas em todo o país) e o Sindi-Clube (responsável pelo setor, com 900 clubes em São Paulo) acharam por bem analisar apenas assuntos ligados ao esporte amador olímpico.
Raros foram os momentos em que se discutiram junto à imprensa os reflexos que a lei teria sobre os clubes socioesportivos, sociedades sem fins lucrativos basicamente voltadas ao esporte amador e à formação dos atletas olímpicos.
O polêmico artigo 27, mesmo com a emenda que determina que os clubes podem virar uma sociedade com fins econômicos, se não sujeita à falência e dá prazo de dois anos para se adaptar à nova situação, de maneira alguma satisfaz os clubes amadores.
A realidade desses clubes é totalmente distinta da dos clubes de futebol, por princípios e objetivos. De tradição centenária e únicos formadores de atletas que representam o país em competições internacionais e Olimpíadas, investem durante anos em categorias de base, sem objetivo de lucro.
Ora, se eles forem obrigados a assumir a feição de sociedades comerciais e a estabelecer uma relação de empregado e patrão com seus atletas, com todos os ônus tributários que isso acarretaria, a alternativa será simplesmente não investir mais na formação desses atletas, tirando-lhes a única oportunidade de evoluir no esporte.
Por outro lado, considero uma vitória para a CBC a aprovação da emenda sugerida por nós, agora sob o parágrafo 5º do artigo 36, no que tange à participação de atletas amadores de qualquer idade e semiprofissionais com idade superior a 20 anos em competições esportivas profissionais. Se assim não fosse, como seria possível a realização de competições como a São Silvestre ou campeonatos de elite?
É bom lembrar que, das 54 medalhas olímpicas já conquistadas pelo Brasil, 51 foram obtidas por atletas de clubes de esporte amador. Os clubes de esporte amador do país têm um trabalho reconhecidamente imprescindível.
O futebol é inegavelmente importante no país, merece toda a atenção de nossos legisladores e deveria ser tratado em legislação ou capítulo especial.
Nas mãos do Senado para a votação, o projeto precisa ainda ser repensado. Hoje, infelizmente ele está prejudicando não só clubes amadores como as futuras gerações de atletas que deixarão de receber o apoio dessas agremiações.


Antonio de Alcântara Machado Rudge é presidente da CBC (Confederação Brasileira de Clubes) e do Sindi-Clube (Sindicato dos Clubes Esportivos do Estado de São Paulo)






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