São Paulo, sábado, 14 de fevereiro de 2009

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JOSÉ GERALDO COUTO

Amor e sexo


Da sedução à la Robinho à amorosa tabelinha, o erotismo entra em campo de várias maneiras


HOJE VAMOS falar de sexo. Não, não vou ficar especulando se Robinho estuprou ou não a garota que o acusa nem vou comentar a vida sexual de Ronaldo ou de qualquer outra pessoa. O que interessa aqui é o erotismo simbólico presente no futebol e em seu entorno. Já virou lugar comum comparar o gol, momento de clímax do futebol, a um orgasmo. Por extensão, perder um gol feito é como broxar na hora H. E uma expressão como "entrar com bola e tudo", a bem da verdade, é quase pornográfica. Mas há nessa analogia entre futebol e sexo uma coisa curiosa. Observando bem, a relação erótica (no plano simbólico, insisto) se dá tanto entre adversários como entre companheiros de time. Calma, eu explico. Há um forte traço de dominação sexual, ou de sedução e conquista, no embate entre um jogador, sobretudo um atacante, e seu oponente. Uma bola metida entre as pernas equivale a um estupro, e não por acaso o jogador que a sofre fecha as pernas instintivamente, tarde demais, como uma donzela tentando defender a castidade. Um jogador que fica serpenteando diante do adversário, oferecendo-lhe a bola como uma maçã do Éden, só para tirá-la do alcance do infeliz no último instante, é um autêntico sedutor. O locutor diz: "Tirou fulano pra dançar". O modelo clássico dessa atitude de lasciva provocação era o estilo do ponta-esquerda Edu, do Santos e da seleção nos anos 60 e início dos 70. Robinho é um atacante em cujo jogo o componente sensual é notório. Rebola para cá, rebola para lá, pedala, acena com a entrega, hipnotiza o adversário e, no instante decisivo, escapa, deixando-o desconcertado, sem equilíbrio. Seu golaço contra a Itália, na terça-feira, ilustra à perfeição o que estou dizendo. O estilo Robinho consiste em amolecer o antagonista para então se aproveitar de seu ponto fraco. É como o conquistador que embriaga sua vítima com bebida, alguma droga ou a mera lábia para minar sua resistência e consumar a violação. Mas há também uma relação erótica, igualmente simbólica, mas de outra natureza, entre jogadores de uma mesma equipe. Chico Buarque observou uma vez que, diferentemente das meninas, que podem andar de mãos dadas ou abraçadas com amigas sem despertar censura, os meninos precisam sublimar seu afeto pelos amigos de outras maneiras, por exemplo jogando futebol. Já nem falo da comemoração de um gol ou uma vitória, quando marmanjos se abraçam, se beijam, rolam no chão. O próprio passe, sobretudo aquele que coloca o companheiro numa boa situação, já é um claro gesto de carinho. A devolução, idem. Por isso, a tabelinha é a jogada mais amorosa que pode existir. O gol de Elano no jogo contra a Itália foi uma dessas tabelas que são verdadeiras cenas de amor; o segundo gol do Palmeiras contra o Mirassol, feito por Keirrison em parceria com Diego Souza, foi outro. Resumindo drasticamente esta elucubração, talvez se possa dizer que, na relação com o adversário, prevalece o sexo e, na relação com o parceiro de time, sobressai o amor. E o erotismo, que não se confunde com a pornografia, é a fusão dessas duas coisas.

jgcouto@uol.com.br


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