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No país da bola, futebol se torna um subemprego
Dois terços dos contratos registrados na CBF têm duração de até 4 meses, fazendo da profissão um serviço temporário
Jogadores cruzam o país para viver amontoados em alojamentos antes de sua entressafra, que começa com o final dos Estaduais
PAULO COBOS
ENVIADO ESPECIAL A PORTO VELHO
Viajar milhares de quilômetros, muitas vezes de ônibus
por estradas esburacadas. Dormir em alojamentos com menos de 100 m2 com outros 20
homens. Deixar a mulher, filhos, na cidade de origem. Tudo
isso para trabalhar por três ou
quatro meses a troco de, na
média, menos de dois salários
mínimos por mês e, depois, só
levar incerteza de volta.
Parece a rotina de um boia-
-fria que deixa o Nordeste para
ganhar a vida nos canaviais
paulistas. Mas essa é a realidade da imensa maioria dos praticantes da profissão que é sonho
de quase todo menino do país.
Longe do minúsculo mundo
dos grandes, o futebol do Brasil
tem hoje uma estrutura de trabalho tão precária como as do
camponeses que cruzam o país
em busca de empregos temporários e mal remunerados.
A Folha fez um levantamento nos mais de 10 mil contratos
registrados pela CBF em 2010.
Nada menos do que 73% deles
têm validade de, no máximo,
seis meses, sendo que quase
dois terços deles expiram em
apenas quatro meses.
Como a maioria dos Estaduais acaba antes do encerramento do primeiro semestre,
não é exagero dizer que pelo
menos metade dos jogadores
profissionais do país -são 23
mil, segundo a CBF- não tenha um emprego na segunda
metade da temporada.
"Isso é horrível. Na realidade, a profissão de jogador de futebol virou um emprego temporário", afirma Alfredo Sampaio, o presidente da Fenapaf
(Federação Nacional dos Atletas Profissionais de Futebol).
O sindicalista nem culpa os
clubes pela situação. "É o mercado. Eles não vão fazer contratos de um ano se têm jogos
por apenas quatro meses. A
culpa é do calendário."
Em todo o país, especialmente nas regiões Norte e Nordeste, mas também no rico interior paulista, a tática é recrutar
um batalhão de atletas em outras partes do país, alojá-los
juntos em casas alugadas e dispensá-los quando o torneio
acabar. "Precisamos questionar quanto vale ter a pena clubes como esses. Acaba sendo só
um subemprego para os atletas", declara Sampaio.
Em muitos casos, o fim dos
contratos curtos pode acontecer ainda antes. Segundo os dados da CBF, na primeira semana de março aconteceram quase 200 rescisões de contratos,
sendo que a maioria deles foi
assinada já em 2010.
A precariedade do emprego
não assusta os milhares de brasileiros que cruzam o país em
busca de uma vaga que não vai
existir em três meses. E um deles, o baiano Dênis, 29, que tem
no Shallon de Rondônia o seu
11º clube, aponta um motivo
prático para a realidade do
mercado. "Se o seu nome está
no BID [o boletim da CBF que
mostra quem tem contrato válido], você tem mais chances de
conseguir um outro emprego."
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