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JUCA KFOURI
Entre o direito e a justiça
O Brasil justo não será construído se o Judiciário suscitar tantas desconfianças em seus julgamentos
"TEU DEVER é lutar pelo direito. Mas no dia em que
encontrares o direito em
conflito com a justiça, luta pela
justiça."
A frase é do professor de direito do
Largo de São Francisco, o saudoso
André Franco Montoro, combatente dos mais ardorosos pela redemocratização do Brasil e dos mais limpos e eficazes governadores de
São Paulo.
É uma frase irretocável, que cai
como luva para abrir o raciocínio
que segue abaixo, com o correspondente pedido de desculpas ao leitor
que esperava ler aqui o comentário
sobre a rodada que manteve o São
Paulo na liderança.
Mas não dá.
Não dá diante da condenação do
editor e presidente do diário "Lance!", Walter de Mattos Jr., em primeira instância, pelo juiz da 45ª Vara Civil do Rio Janeiro.
Ele foi condenado a pagar indenização de R$ 9.000 a Ricardo Teixeira por causa de um artigo que escreveu, em 31 de julho de 2006, para o
jornal "O Globo" e republicado pelo
diário "Lance!".
No artigo, com absoluto equilíbrio, lamenta-se a impunidade da
cartolagem do futebol diante de tudo que foi denunciado por duas CPIs
no Congresso Nacional.
O punido, embora ainda caiba recurso, foi, mais uma vez, quem exerceu o sagrado direito da crítica e não
quem descumpre as leis vigentes
no país.
Curiosamente, aliás, Teixeira não
processou "O Globo", que publicou
originalmente o artigo, mas, apenas,
Mattos e o "Lance!".
Fosse a condenação uma exceção
e já seria gravíssimo.
Infelizmente, porém, tem sido a
norma, muito porque o Judiciário
parece querer se vingar da imprensa
que, ainda bem, vem há tempos revelando como andam mal as coisas
no chamado Terceiro Poder.
E não é preciso ir ao Estado de
Rondônia, onde o presidente do Tribunal de Justiça está preso por envolvimento com venda de sentenças, para fazer a constatação.
São raros os Estados, na verdade,
em que não há casos semelhantes, e,
particularmente no Rio, a promiscuidade é tamanha que não são poucos os membros do Judiciário que
viajam à custa de entidades privadas, por exemplo, como a CBF, principalmente nas Copas do Mundo, fato fartamente noticiado desde a Copa de 1990.
Nem por isso os que se deliciam
em hotéis cinco estrelas se dão por
impedidos de julgar casos da CBF ou
de seu presidente, o grande promotor das mordomias.
Se alguém com o espaço que Mattos tem para espernear é vítima de
tamanha injustiça, imagine-se o cidadão comum, que não pode se
queixar nem para o bispo.
A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e a Associação Nacional de Jornais (ANJ) não podem ficar silentes diante de tais atentados
à liberdade de imprensa.
Porque tudo faz parte da desconstrução do Brasil que os homens de
bem querem edificar.
Filho de promotor público, este
colunista jamais se esquecerá do
que ouviu de seu pai pouco antes
deste se aposentar, desiludido com a
aplicação da Justiça no país e com o
sistema penitenciário.
"Meu filho, fique o mais longe que
puder dos Fóruns e delegacias. Procure evitá-los até como testemunha.
Porque eu sei como é feito o direito
no Brasil."
A história já fez justiça a Franco
Montoro e tem dado razão ao procurador de Justiça Carlos Alberto
Gouvêa Kfouri, meu pai.
Sem dúvida, fará justiça também à
luta que travam homens como Walter de Mattos Jr.
Mas, neste caso, a que preço?
Ao preço da intimidação, do sentimento de impotência e da pior das
sensações que é a que sente a vítima
de uma injustiça?
blogdojuca@uol.com.br
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